O enfermeiro acredita na capacidade de superação dos indivíduos frente as desavenças da vida, mesmo porque, existem evidências científicas que mostram a contribuição da saúde para a qualidade de vida das populações.
A enfermagem é uma profissão historicamente marcada pelo compromisso com a saúde e o bem-estar do ser humano em todas as fases do ciclo de vida. Tem passado por constantes transformações decorrentes das exigências dos “novos tempos”, que reclamam por respostas mais rápidas, precisas e coerentes para os problemas de saúde do mundo moderno. Nunca o enfermeiro teve sua agenda de responsabilidades tão repleta e cada vez mais ampliada e diversificada, pois está constantemente a ser requisitado a ocupar espaços estratégicos para implementação de políticas sociais, especialmente de saúde.
Podemos afirmar que tal facto é fruto de muita disciplina, esforço, dedicação, competência e responsabilidade. Estes profissionais vêm, cada vez mais, adquirindo e aprofundado conhecimentos científicos geradores de ganhos significativos em saúde. Essa procura constante por novos saberes, principalmente através de processos formais como é o caso dos cursos de pós-graduação/especialização, mestrados e doutoramentos, têm facultado a esses técnicos competências, mais do que suficientes, para prestação de cuidados diferenciados de alta qualidade adaptados as situações de grande complexidade. Têm propiciado a produção de estratégias, dispositivos e práticas fundamentadas no pensamento da enfermagem e consequentemente de grande interesse para a sociedade (1).
Essa produção irrefreável de conhecimentos, o aperfeiçoamento cada vez maior de cuidados de elevada perícia técnica e a indiscutível capacidade de trabalhar em diferentes contextos e equipas, os tornam cada vez mais indispensáveis em qualquer discussão que privilegie a interdisciplinaridade e o trabalho multiprofissional.
São diversas as áreas onde a actuação desses profissionais é imprescindível e notória: assistencial, educativa, gerência, coordenação de programas/projectos sejam eles governamentais ou não, assessoria, consultoria, auditoria e na área do ensino e pesquisa.
Muitos são os governos que inteligentemente acompanham a marcha acelerada desses técnicos e usufruem do seu potencial para a resolução de muitos de seus problemas que, mal ou bem, acabam sendo transversais ao de muitos outros países. Incentivam e respeitam a sua formação especializada fornecendo instrumentos legais para sua aplicação e aproveitam a sua proximidade para com os cidadãos e fazem chegar as respostas necessárias de forma rápida e segura. Contudo, observa-se que os mais críticos e pessimistas insistem em associar o facto, a dificuldade financeira que o sector saúde atravessa nesses países, não observando a competência, capacidade e a alta qualificação desses profissionais.
Em muitos países os enfermeiros estão legalmente autorizados a prescrever medicamentos, o que tem gerado uma óptima aceitação por parte dos utentes/usuários e uma redução significativa de desperdícios. Palavras como segurança, agilidade, dinamismo, rentabilidade, melhoria no acesso e na qualidade dos serviços de saúde, prática profissional mais adequada, uso eficaz de recursos aparecem em estudos realizados (2;3;9).
O Conselho Internacional de Enfermeiras (CIE) destaca alguns países onde essa prática é uma realidade: “ Estados Unidos, Canadá, Austrália, Inglaterra, Irlanda, Suécia, Nova Zelândia, África do Sul, Botsuna, França, Zâmbia e Quénia. Muitos outros também adoptaram essa medida como é o caso do Brasil, Argentina e mais recentemente a Espanha (2;3;4;5;9).
Por ser uma tendência a nível mundial, verifica-se que enfermeiros de outros países estão seriamente a reflectir e possivelmente irão reivindicar desse direito (respaldo legal) com o intuito de poderem trabalhar dentro da legalidade e com maior segurança. Facto perfeitamente aceitável visto que a profissão é regulamentada por lei em muitos países.
Acredita-se que a maioria dos enfermeiros já utilizaram desse último recurso (prescrição de medicamento), seja em situações de urgência, emergência ou em qualquer outra onde a presença de um médico não foi possível.
Considera-se que “se esse técnico pode agir em situações de urgência e emergência; está mais do que preparado para agir em muitas outras”, até porque, jamais ficará de “braços cruzados” à assistir o sofrimento ou deterioração do estado de saúde de seus pacientes e nem tão pouco, deixará de ajudar as famílias e comunidades naquilo que tiver ao seu alcance em matéria de saúde.
O termo prescrever segundo a CIPE significa: “Acção de mandar com as características específicas: Indicar a utilização de um medicamento ou regime, orientar para a administração de um medicamento ou tratamento".
É difícil imaginar que um doente crónico acamado em seu domicílio tenha que ficar a espera da marcação de uma visita médica, que muitas vezes não ocorre, por necessitar de um medicamento que pode ser perfeitamente prescrito pelo enfermeiro. As pessoas almejam, entre outras coisas, cuidados de saúde seguros e bem-estar e o enfermeiro está entre os profissionais mais bem preparados para lhes proporcionar.
Muitos consideram não ser mais possível aceitar que estes técnicos, tão bem preparados, continuem reféns de "conveniências corporativas" que os impedem de avançar e os distanciam da realidade. Crêem em uma enfermagem verdadeiramente autónoma inserida em espaços multidisciplinares. Confiam que qualquer desvio desse sentido deva ser combatido em prol de uma saúde cidadã (6).
Para finalizar, é importante frizar que a prescrição de medicamentos e a solicitação de exames é uma prática realizada por enfermeiros, há mais de vinte anos, em muitos países. Estudos evidenciam que a medida agilizou, dinamizou e rentabilizou os serviços de saúde. Por ser uma tendência mundial, acredita-se que essa prática se generalizará. O que nos faz pensar que chegou o momento de escolher o caminho que se quer seguir e desde já começar a percorre-lo.
Bibliografia
1-CANÁRIO, R. - Formação e mudança no campo da saúde. In R. Canário (org.), Formação e situações de trabalho. Porto: Porto Editora. 1997
2-Consejo General de Enfermería – Marco referencial para la prescrisón de enfermaria. Disponível:
4-MINISTERIO DE SALUD (MS) - Créase el Programa de Salud Familiar. Del 02/02/2009; Boletín Oficial 10/02/2009. RESOLUCION 118/2009
5-Boletín Oficial de las Cortes Generales - PROPOSICIONES DE LEY DEL CONGRESO DE LOS DIPUTADOS. De modificación de la Ley 29/2006, de 26 de julio, de garantías y uso racional de los medicamentos y productos sanitarios.
6-Doutor Enfermeiro - Prescrição de fármacos: Enf. Germano Couto, uma vez mais... Disponível:
Leite materno é o alimento mais adequado e recomendado para os bebés.
Os pequeninos parecem que já sabem e procuram, na primeira oportunidade, se “abarrotarem” desse alimento rico e gratuito.
São vários os estudos que atrelam o aleitamento materno a uma vida saudável. Salientam o seu poder na prevenção e combate às ameaças externas, mesmo porque, o leite materno é rico em factores imunológicos como anticorpos, macrófagos, neutrófilos, linfócitos, lactoferrina, lisosima e factor bífido que protegem a criança (1;9).
A amamentação além de nutrir, proteger e favorecer o desenvolvimento físico e cognitivo dos bebés, favorece a criação de um forte vínculo afectivo entre mãe e filho, onde laços de amizade e confiança são construídos e fortalecidos. Logo podemos afirmar que a amamentação não só proporciona nutrientes essenciais. É um momento único e rico de carinho, afecto, doação e troca. É uma condição básica para o estabelecimento de vínculos emocionais. É uma prática natural com repercussões futuras.
Muitos são os estudos de John Bowlby sobre a teoria da vinculação. Destacam a necessidade humana de estabelecer ligações afectivas de proximidade ao longo da vida, tendo o objectivo alcançar a segurança que permite explorar o “self”, os outros e o mundo; os pais são os co-autores da vida de seus filhos, preenchendo lacunas, projectando o futuro.
Existem pesquisas que mostram que 90% das mães portuguesas iniciam o aleitamento materno. Contudo, essas mesmas pesquisas evidenciam que “quase à metade dessas mães desistem de amamentar muito precocemente”, o que mostra que a grande parte não consegue cumprir o seu projecto de dar de mamar aos seus bebés (2).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) (9) recomenda o aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade e associado a outros alimentos até os dois anos ou mais. É clara quando diz que leite materno contém tudo que a criança necessita até os seis meses, não sendo necessário qualquer complemento alimentar salvo recomendações de técnicos de saúde altamente capacitados. Coloca que introduzir outros alimentos, antes dos seis meses, pode causar alguns prejuízos para a criança e cita: “maior número de episódios de diarreia; maior número de hospitalizações por doenças respiratórias; risco de desnutrição; menor absorção de nutrientes importantes do leite materno, como o ferro e o zinco e redução na duração do aleitamento materno.
LAMOUNIER, citado por Amorim e Andrade (3) refere que quando alimentos complementares são introduzidos antes dos 6 meses de vida, a criança passa a ingerir menos leite humano o que pode trazer riscos como alergias alimentares, aumento da taxa de morbimortalidade e uma maior incidência de doenças crónicas/degenerativas na idade adulta.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (4) disponibiliza um esquema para introdução dos alimentos complementares.
Faixa etáriaTipo de alimento
Até completar 6 meses:Aleitamento materno exclusivo
Ao completar 6 mesesLeite materno, papa de fruta, papa salgada, ovo, carne
Ao completar 7 mesesSegunda papa salgada
Ao completar 8 mesesGradativamente passar para alimentação da família
Ao completar 12 mesesComida da família
Fonte: Adaptação da Sociedade Brasileira de Pediatria (2006)
Muitos países conseguiram reduzir a taxa de mortalidade infantil (TMI) através de programas de imunização mais eficientes, identificação e tratamento atempado de infecções, melhoria na oferta de atendimento/acompanhamento pré-natal e pós-parto e principalmente através da inclusão de programas educativos promotores do aleitamento materno (5).
Como é sabido as mamas são estruturas complexas compostas por tecido glandular “glândulas túbulo-alveolares” constituídas por lóbulos. Estes últimos são formados por alvéolos que têm finalidade à produção de leite. Durante a gravidez as mamas aumentam de tamanho, as aréolas ficam mais escuras e as veias mais visíveis. O sistema de ductos (canais) aumenta e diferencia-se assim como os alvéolos, lóbulos e lobos. Nos primeiros dias pós-parto a produção de leite é pequena, porém é rica em proteínas e tem menos gorduras se comparado com o leite produzido a partir do sétimo ao décimo dia pós-parto. É importante que durante a amamentação a criança esvazie bem a mama visto que o chamado “leite posterior” contém mais calorias e por isso satisfaz mais o bebé. Além de um local tranquilo, um posicionando adequado e uma boa “pega” por parte da criança é recomendado que seja fornecido o alimento sem restrições de horários e de tempo - “amamentação em livre demanda”. Uma boa pega requer um abocanhamento não apenas do mamilo como também da auréola formando assim um lacre perfeito.
Estudos realizados evidenciaram que o uso da mamadeira (biberão) e da chupeta favorecem o desmame precoce e podem ser uma fonte de contaminação. PALMER (6) considera que o uso da chupeta está associado a uma maior ocorrência da candidíase oral, otite média e de alterações do palato.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) (7) destaca quatro pontos-chave que caracterizam o posicionamento e pega adequados:
Posicionamento adequado
1. Rosto do bebé de frente para a mama, com nariz na altura do mamilo;
2. Corpo do bebé próximo ao da mãe;
3. Bebé com cabeça e tronco alinhados (pescoço não torcido);
4. Bebé bem apoiado.
Pega adequada
1.Aréola visível acima da boca do bebé;
2. Boca bem aberta;
3. Lábio inferior virado para fora;
4. Queixo tocando a mama.
Para haver uma óptima produção de leite é necessário que a mãe esteja bem nutrida e hidratada. É muito comum observar um aumento do apetite e um maior consumo hídrico, devendo este não ser exagerado. No caso das mães vegetarianas é importante alertar para importância de ingerir proteínas e vitaminas em quantidade suficiente.
Alguns estudos citam algumas recomendações para as mães nesta fase:
- Consumir dieta variada, incluindo pães e cereais, frutas, legumes, verduras derivados do leite e carnes;
- Consumir três ou mais porções de derivados do leite por dia;
- Esforçar-se para consumir frutas e vegetais ricos em vitamina A;
- Certificar-se de que a sede está sendo saciada;
- Evitar dietas e medicamentos que promovam rápida perda de peso (mais de 500g por semana);
- Consumir com moderação café e outros produtos cafeinados.
O comportamento dos bebés é muito variável, visto serem diferentes uns dos outros. Cada um tem sua própria personalidade, sensibilidade, vivenciam momentos diferentes, tanto durante a vida intra-uterino como durante o parto, e tem direitos específicos assegurados. A Declaração de Barcelona sobre os direitos da mãe e do recém-nascido de 2001 refere que o recém-nascido “é uma pessoa com direitos específicos, que ele não pode exigir por si próprio devido à sua imaturidade física e mental. Estes direitos impõem obrigações e responsabilidades à sociedade, que as instituições legislativas e executivas de todos os países devem reforçar. Éum ser livre, com dignidade, com direito à vida e a cuidados de saúde adequados, que lhe permita um óptimo desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social”.
O enfermeiro tem o papel de facilitador do processo de transição para maternidade. Desenvolve competências globais e específicas com o intuito de ajudar a mãe a delinear um projecto de maternidade eficaz. Utilizando linguagem simples e acessível, este técnico incentiva e apoia o aleitamento materno; procura diminuir a insegurança, desconforto, sofrimento e sentimentos de incompetência; detecta precocemente situações de risco e garante uma assistência multidisciplinar rápida e segura; promove espaços para troca de ideias e sentimentos, esclarecendo dúvidas, ajudando ultrapassar obstáculos/dificuldades; têm em atenção a história, os hábitos, costumes, as particularidades de cada um e uma visão ampla da saúde; orienta para práticas fundamentadas em bases científicas. Segundo a UNICEF 2002 (7) os enfermeiros devem estar ao lado da mãe, orientando-a no início do aleitamento materno e ajudando-a na busca de soluções para suas dúvidas.
Estes profissionais também estão atentos às crianças com necessidades especiais, mães e bebés em situação de vulnerabilidade, sobretudo em questões complexas como maus-tratos, negligência, abandono ou qualquer outra situação de perigo eminente. Procuram responder de forma adequada e rápida orientando-se segundo os princípios éticos e deontológicos da profissão, em conjunto com outros profissionais de saúde e instituição, observando atentamente leis e recomendações específicas como por exemplo a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, entre outras.
A família é a primeira célula de socialização dos indivíduos. É um espaço emocional e afectivo. É o primeiro ambiente que prepara verdadeiramente o homem para a relação com o seu semelhante. (8)
Durante suas intervenções assistenciais/educativas, o enfermeiro deve procurar incluir às pessoas mais significativas para a gestante/puérpera, como o companheiro, a mãe, os filhos mais velhos, entre outros, para que estes possam ajuda-la de forma segura em momentos de dificuldade.
A OMS (9) disponibiliza alguns recursos muito utilizados no aconselhamento e um plano de actuação:
- Praticar não só a comunicação verbal como também à não-verbal (gestos, expressão facial, entre outras).
- Remover barreiras como mesa, papéis, promovendo uma maior aproximação entre a mulher e o profissional de saúde;
- Usar linguagem simples e acessível;
- Dar espaço para a mulher falar. Para isso, é necessário dedicar tempo para ouvir, prestando atenção no que a mãe está dizendo e no significado de suas falas.
- Demonstrar empatia, ou seja, mostrar à mãe que os seus sentimentos são compreendidos, colocando-a no centro da situação e da atenção do profissional;
- Evitar palavras que soam como julgamentos, como, por exemplo, certo, errado, bem, mal, etc.
- Aceitar e respeitar os sentimentos e as opiniões das mães, sem, no entanto, precisar concordar ou discordar do que ela pensa;
- Reconhecer e elogiar condutas correctas realizadas pela mãe.
- Oferecer poucas informações em cada aconselhamento, prendendo-se a situação do momento;
- Fazer sugestões em vez de dar ordens;
- Oferecer ajuda prática;
- Conversar com as mãe sobre as sua condições de saúde e a do bebé, explicando-lhe todos os procedimentos e condutas.
O plano de actuação deve incluir nos seguintes níveis:
- Promover um crescimento e desenvolvimento adequado ao recém-nascido;
- Educar a família para que proporcione ao lactente nutrientes suficientes para crescer prevenindo a desnutrição, obesidade e alergias;
- Estruturar o ambiente para o desenvolvimento das interacções da criança com o meio;
- Desenvolver nos pais capacidades para cuidar a criança, promovendo a saúde e prevenindo a doença.
Para finalizar é importante que todas as mães estejam conscientes da importância do aleitamento materno nos primeiros meses de vida; que sejam incentivadas e devidamente informadas sobre seus direitos; que existam políticas de saúde claras de promoção ao aleitamento materno, principalmente nos países onde persistem taxas assustadores de mortalidade infantil; que os sistemas de informação em saúde forneçam dados precisos para priorização de necessidades; que os técnicos de saúde recebam formação adequada a ponto de sentirem capacitados para prestar uma assistência totalmente livre de riscos; que a saúde seja um tema dominante nos diferentes discursos sociais e políticos e que todas as crianças sejam consideradas não só parte do processo produtivo da espécie humana, mais também o resultado de uma maturação psicológica influenciada pelo ambiente social, cultural, económico, político, geográfico…pelo mundo.
4-Sociedade Brasileira de Pediatria -Manual de orientação para alimentação do lactente, do pré-escolar, do escolar, do adolescente e na escola. Departamento Científico de Nutrologia. 2006. Disponível:
10-DINIZ, R.L.P. Avaliação do Programa de Incentivo ao Aleitamento Materno do Hospital Geral César Cals um Hospital Amigo da Criança em Fortaleza – Ceará. (Dissertação de Mestrado). Fortaleza-CE, 2003. Disponível: http://www.esp.ce.gov.br/paginas/Dissertações_Teses/AvaliacaoProgIncentivoAleitamentoHGCC.pdf.
11-Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo - Lei n.º 147 / 99 de 1 de Setembro.
12-Mercer, R. (2004). Becoming a mother versus maternal role attainment. Journal of Nursing Scolarship. 36(3), p. 226-232.
Uma das maiores personalidades da enfermagem portuguesa na área da Saúde e Desenvolvimento. ENFERMEIRA ONDINA TOCHA.
Lutadora, incrivelmente generosa e corajosa, bonita pelo seu jeito simples de ser, carinhosa, altamente competente e totalmente comprometida e preocupada com os problemas sociais e de saúde das populações carenciadas, esta enfermeira não media esforços para ajudar, no que fosse preciso, todas as pessoas, principalmente aquelas menos favorecidas e desamparadas.
Com seu jeito próprio e único, chegava e encantava os mais desprotegidos.
Com um sorriso aberto e sincero, iluminava rostos desgastados pelo sofrimento fazendo-os brilhar de alegria e esperança.
Forte, fiel e solidária abria portas, destruía barreiras, perseguia os problemas que as pessoas lhe traziam, até que estes estivessem minimizados ou solucionados.
Transportava sempre consigo a descontracção e atraía a atenção até do mais presente-ausente.
Vibrava as emoções ao falar e contagiava com sua sabedoria todos aqueles que resistiam escutar.
Tinha o dom de humanizar, facilitar, “descomplexar a vida” pois ressaltava a felicidade, o viver revelado a cada dia e nada a impedia de prosseguir.
Rica enfermeira; muita falta fará a todos nós, mais principalmente aos “sem poder e voz”, aos “ricos de pobreza e sofrimento”, aos “invisíveis” para os olhos de muitos, e a todos os outros que sempre perguntavam por si nas comunidades carentes.
Saudades…muito obrigado por ter escolhido a enfermagem.
Lamentavelmente a indignação dos enfermeiros portugueses se generalizou.
São diversos os jornais, noticiários na TV e sites que fazem referência a situação actual desses profissionais.
Muitos enfermeiros resolveram sair do anonimato e de forma organizada e democrática procuram mostrar a sua insatisfação.
Muitas pessoas andam curiosas e fazem de tudo para incentiva-los e acaricia-los na tentativa de ajudar de alguma forma. Frente a revindicação honesta da classe, que já se arrasta a muito, se intensificaram os esforços na procura de uma solução.
Os sindicatos estão a trabalhar arduamente para que estes técnicos, já tão penalizados, não sejam ainda mais prejudicados.
A Ordem dos enfermeiros segue com muita atenção os acontecimentos e já se manifestou e apelou para o "bom senso", pois não vai tolerar qualquer tipo de desrespeito ou ofensa para com a profissão.
Para quem não sabe, esses técnicos são muito sensíveis a injustiças, diferenças e desigualdades, pois, entre outros valores, observam a igualdade, respeito com o próximo, liberdade responsável, verdade, inclusão, solidariedade e a justiça social.
Sentem-se injustiçados face as contradições impostas que os diferenciam dos restantes licenciados da administração pública. É importante lembrar que o tratamento desigual implica privação e provoca irritabilidade, fadiga, falta de estímulo, ansiedade, entre outros muitos agravos.
Os enfermeiros estão perplexos com o “descaso” dos decisores políticos para com as suas revindicações, pois acreditam, acertadamente, que "pensar saúde" deve incluir todas às pessoas e contemplar a equidade, solidariedade e a participação. O que inclui tratamento igual para todos os profissionais de saúde. Frente as diversas tentativas falhadas por parte destes decisores, apela-se para que estes reflictam e mudem suas posições.
Mundialmente observa-se um número crescente de pessoas envelhecidas. Segundo forte literatura, este fenómeno é consequência da baixa fecundidade, redução da mortalidade, melhor controlo das doenças transmissíveis, contenção das doenças crónicas e da descoberta de vacinas e outros medicamentos mais eficazes. Contudo, esse fenómeno não vem sendo acompanhado com a qualidade de vida perspectivada por muitos, visto se verificar que as unidades de saúde se encontram lotadas de pessoas envelhecidas e que os idosos no seu dia-a-dia ainda suportam conceitos e imagens preconcebidas, simplistas, desajustadas e distantes da verdade.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) (1) definiu qualidade de vida como " (…) a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objectivos, expectativas, padrões e preocupações".
Como sabemos o envelhecimento é um processo natural e deve ser considerado uma experiência positiva, pois é rico em momentos únicos e diferentes. Necessita ser acompanhado de oportunidades contínuas de saúde, participação e segurança. Existem vários factores determinantes no processo que podem influenciar e ditar a forma de se envelhecer: o componente genético, o modo de vida, o ambiente, as experiências vividas, a intelectualidade e as relações familiares.
Vários programas de saúde dirigidos a essa fatia populacional evidenciam a importância da conjugação desses factores e fornecem subsídios para intervenções multidimensionais, que visam assegurar o bem-estar dessas pessoas independentemente da presença ou não da componente doença/comprometimento. Todavia, constata-se, no terreno da prática, que a maioria das acções parte e fundamenta-se na existência desta componente, o que acaba por limitar a resposta de muitos programas. Muitas são as tentativas para justificar esse comportamento: o número insuficiente de técnicos no terreno ou de outros recursos, existência de um grande número de pessoas acometidas por doenças e incapacidades, falhas no repasse ou na clarificação de conceitos/ideias, pouca sensibilização dos executores no terreno, entre outras, o que provoca distorções e dificuldades em se trabalhar com o fenómeno de forma ampliada.
Segundo a OMS (2) em 2025 haverá mais de um bilhão de pessoas com mais de 60 anos e para 2050 é esperado que estes valores dupliquem, gerando um aumento das demandas que suportam os sistemas sociais e de saúde em todo mundo.
Portugal caminha no mesmo sentido, tendo o Instituto Nacional de Estatística (3) sinalizado recentemente que “nos próximos 50 anos, o país poderá continuar com cerca de 10 milhões de residentes, mas manter-se-á a tendência de envelhecimento demográfico, projectando-se que em 2060 residam no território nacional cerca de 3 idosos por cada jovem”. Esta projecção é baseada em um estudo onde foram consideradas as componentes fecundidade, migração e mortalidade e um cenário central “que conjuga um conjunto de hipóteses consideradas como mais prováveis face aos recentes desenvolvimentos demográficos”. Os resultados mostram uma esperança média de vida à nascença muito próxima dos 90 anos em 2060. Se considerarmos o estudo referido, podemos concluir que as pessoas ao alcançarem as idades esperadas irão exigir goza-las com boa saúde, o que reforça a ideia de que os programas dirigidos a essa população devam ser seguidos a risca, livres de interferências e com segurança.
A Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE) (4) define esperança de vida como “status com as características específicas: Idade média de morte numa dada população de nados vivos”. O mesmo instrumento define envelhecimento como “processo de desenvolvimento físico, normal e progressivo, durante a transição da idade adulta para a velhice; de acordo com a idade aproximada e estádios de desenvolvimento, é acompanhado pelo declínio dos processos corporais devido à diminuição da capacidade para regenerar as células, levando à perda de massa e coordenação musculares e de competências psicomotoras (…) ”.
O tema envelhecimento foi sempre muito debatido e com ele os estereótipos que tanto castigam essa fatia populacional e acarretam sérios prejuízos de ordem social e económica. As sociedades capitalistas, valorizadoras da produção e do consumo, infelizmente insistem em acreditar que o progresso só pode ser alcançado através da jovialidade e que os mais envelhecidos pouco ou nada têm a contribuir. Por outro lado existem evidências de que estas pessoas ricas em conhecimentos/experiencias de vida têm ainda muito a acrescentar. Baseado nesse pensamento destaca-se algumas questões que se associam:
Idadismo.
Muitos estudiosos na área tem criticado o uso de uma idade padrão para determinar ou descrever pessoas “mais velhas”. Acreditam que o facto pode ser considerado um factor discriminatório e contraproducente pois entendem que a idade cronológica não é, por si só, marcador para as mudanças que acompanham o envelhecimento e que faz com que uma pessoa seja ou não mais velha. Além disso, afirmam que mitos relacionados ao envelhecimento geram estereótipos que interferem negativamente nas pessoas, principalmente nas idosas, por resultarem em idadismo, que é nada mais do que uma forma de discriminação baseada na idade do indivíduo. A CIPE (4) define discriminação pela idade como sendo “ (…) prática de fazer distinções no tratamento; mostrar parcialidade ou preconceito com base na idade”.
Toda essa discussão leva-nos a pensar que as pessoas não envelhecem todas ao mesmo tempo e da mesma forma. Segundo a Direcção Geral de Saúde (5) existe uma grande diferença em envelhecer no feminino ou no masculino, sozinho ou no seio da família, casado, solteiro ou divorciado, com filhos ou sem filhos, no meio urbano ou no meio rural, no seu país ou no estrangeiro, activo ou inactivo. Já FONSECA (6) coloca que as pessoas independentemente da idade biológica apresentam outras idades como a psicológica e a sociocultural e que influenciam directamente na forma de estar na vida. A idade biológica refere-se ao funcionamento do organismo com base na condição biológica dos seus tecidos comparados com um determinado padrão; a idade psicológica prende-se a capacidade e adaptação ao meio de acordo com as mudanças que ocorrem; e por último a sociocultural que está ligada ao conjunto específico de papéis sociais que uma pessoa adopta frente a outras, a sociedade e até mesmo à sua cultura.
Tempo de vida / Qualidade de vida.
É certo que os avanços científicos e tecnológicos contribuíram para uma vida mais longa. Porém, esses progressos não foram capazes de afastar por completo as doenças crónicas degenerativas nem garantiram que o prolongamento do tempo de vida seja gozado com a qualidade desejada. Facto gerador de muita frustração principalmente por parte dos mais interessados, os idosos. Cientes disso, muitos pesquisadores se lançaram de imediato em um novo desafio: o de aliar o aumento da expectativa média de vida, uma real elevação da sua qualidade. PESSINI (7) em seu trabalho coloca que a longevidade sempre fez parte das aspirações das pessoas, e acrescenta “a humanidade quer mais quando questiona e busca outras respostas que se constituem em profundos desafios relacionados à longevidade”.
Conceituar qualidade de vida não é uma tarefa fácil, pois cada indivíduo tem a impressão de que já sabe o que esta quer dizer, ou quando não, sente o que ela exprime. A OMS (1) coloca qualidade de vida como “ (…) a percepção que o indivíduo tem da sua posição na vida, dentro do contexto de sua cultura e do sistema de valores de onde vive e em relação a seus objectivos, expectativas, padrões e preocupações”. É um conceito muito amplo que incorpora de uma maneira complexa a saúde física, nível de dependência, as relações sociais, as crenças e a relação com as características proeminentes no ambiente.
Para alguns pesquisadores, um envelhecimento com uma perspectiva positiva requer que seja garantido ao indivíduo a oportunidade de participação em questões de ordem social, política, cultural, espiritual que o mesmo tenha o direito de usufruir. Com isso assegura e respeita-se os valores universais de liberdade e igualdade e garante o direito à cidadania. CABRITA (8) reforça esse pensamento quando refere que é importante que o idoso continue a desenvolver actividades e participe activamente fazendo a sua parte em prol da família, da comunidade e do seu país.
As pessoas envelhecidas têm os mesmos direitos e devem tomar suas decisões.
O direito das pessoas não se modifica a medida que estas envelhecem. Os indivíduos com idades avançadas têm o mesmo direito de viver a vida com qualidade como qualquer outra. A sociedade contemporânea, vista por muitos como de consumo, costuma privilegiar os indivíduos mais jovens criando sobre os cidadãos, principalmente nos idosos, situações constrangedoras e geradoras de fracturas profundas nas relações sociais. Além disso, alimenta um modelo de beleza dominado por estereótipos que valorizam o símbolo da juventude de forma exagerada, desprestigiando e desafiando constantemente a forma possível de estar na vida. STANHOPE & LANCASTER (9) diz que “ (…) o envelhecimento é um processo normal que não é bem compreendido e, ao longo dos anos, têm surgido mitos a ele associados. Alguns dos mitos comuns implicam a percepção de que todos os idosos são débeis, senis, surdos, que não conseguem adaptar-se à mudança”.
A pressão dos estereótipos acerca da velhice faz com que o idoso sinta-se fragilizado e angustiado, observando-se uma diminuição acentuada na sua auto-estima e repercussões na sua autonomia. Com a auto-estima abalada este, na maioria das vezes, não encontra outra saída a não ser o isolamento, o que o torna ainda mais dependente, necessitando da família para manter o equilíbrio. A família com a intenção de amparar, proteger e cuidar acaba impedindo, muitas vezes, que o idoso tome suas próprias decisões a respeito de sua própria vida, afectando assim a sua liberdade.
Envelhecer não significa obrigatoriamente uma redução na capacidade de tomar decisões. Muito pelo contrário. GOLDIM (10) afirma que a autonomia do idoso deve ser preservada, suas convicções respeitadas e que é importante avaliar o grau de capacidade que a pessoa idosa tem para tomar suas decisões. A capacidade de decisão da pessoa se baseia em diversas habilidades, tais como: “envolver-se com o assunto, compreender ou avaliar as alternativas e fazer a comunicação da sua preferência”.
No passado os idosos ocupavam lugares de destaque e tinham um papel de prestígio devido a experiência acumulada durante os anos. Eram reconhecidos no seio familiar como elementos importantes, onde a sua opinião e a sua decisão era, na maioria das vezes, aceita e respeitada por todos. Hoje essa posição foi deixada um pouco para trás. Não é raro observar que muitos idosos são levados para lares, casas de repouso e outras instituições do tipo e acabam sendo “esquecidos”. Outros são deixados sozinhos em suas moradas onde recebem ocasionalmente uma visita ou outra de algum familiar ou amigo. Não se sabe ao certo o que é pior. Muitos familiares com o intuito de ajudar acabam cometendo alguns erros do tipo: modificam a arrumação do mobiliário, descaracterizando o ambiente que o idoso criou para si; inutiliza certos objectos com a justificativa de não serem mais úteis; controla seus gastos, fazendo com que o idoso perda o direito de gastar livremente o seu próprio dinheiro; entre outros. Tudo isso faz-nos pensar que o indivíduo possa vir a perder o prazer pelas coisas que, na grande parte das vezes, custaram muito à conquistar e gerar mais dependência e vulnerabilidade quando este se torna incapaz de modificar tal situação.
Factores que interferem na sexualidade
O processo de envelhecimento acompanha algumas mudanças fisiológicas, psicológicas e trás modificações nos papeis sociais independente da heterogeneidade do envelhecimento individual. Porém, todas essas mudanças não necessariamente afectam a vida sexual das pessoas, pois a maioria continua sendo capaz de usufruir experiências sexuais bastantes gratificantes. Todavia, observa-se que alguns factores acabam interferindo no interesse pela sexualidade:
* Doença - Interfere na expressão física da sexualidade. Doenças como diabetes e outras afecções que atingem o sistema vascular ou nervoso, o aparelho geniturinário ou o próprio efeito colateral de certos medicamentos afectam o desempenho sexual e reduzem o interesse pela sexualidade.
* Preconceitos socioculturais - A ideologia cultural marcada pelos estereótipos, principalmente nos países ocidentais, influenciam negativamente o processo de envelhecimento, fazendo com que o idoso se torne refém destes. Por se sentir pressionado pelas exigências adaptativas ele acaba por acreditar, de forma errada, na progressiva e generalizada incompetência assim como na impotência sexual.
* Auto-estima - A sociedade contemporânea tende a valorizar a juventude e desprezar de maneira cruel os idosos em termos de sua aptidão e atracção sexual. Muitos idosos, principalmente as mulheres, acabam por abandonar a ideia por acharem que perderam a sua feminilidade ou a capacidade de atrair e agradar. Algumas se voltam para as técnicas de rejuvenescimento na tentativa de se tornarem atraentes ou de negarem o próprio envelhecimento. Segundo MESSINA (11) essa atitude ilusória de se buscar uma juventude eterna gera o surgimento de uma nova configuração corporal, “ (…) que altera a imagem do sujeito velho, sua semelhança familiar, suas características herdadas, suas marcas vitais, numa busca por substituir um traço individual por um outro idealizado diferente do seu”.
* Conhecimento - A falta de conhecimento a respeito da sexualidade é outro problema. Os preconceitos e os estigmas a cerca do assunto fazem com que os idosos não procurem de forma aberta e honesta informações e orientações. Rodeados de tabus a cerca do assunto acabam deixando de lado a ideia desviando sua atenção para outras áreas. Vilaça Ramos diz que “ (…) a ignorância assenta em ideias feitas e até em constrangimentos psicológicos que fazem dele uma espécie de tabu” (12).
Sempre há tempo para envelhecer
Envelhecer não é algo que só acontece aos outros e sim uma experiência impar e altamente pessoal que afecta a todos os que vivem por tempo suficiente. Quando falamos do envelhecimento, nos referimos a um processo natural e universal que se inicia com o nascer biológico e a partir daí todos nos tornarmos envelhecidos. O curso natural da existência humana não se limita a uma sequência de factos e acontecimentos, nem tão pouco a uma juventude passada. Envelhecer é ter a oportunidade de se puxar pela memória e viajar através das lembranças, boas ou ruins, e reviver momentos significativos que se passaram no percurso da vida. Além de poder realizar tal façanha, por ter adquirido bagagem suficiente, mantém a responsabilidade de continuar a sua história de vida que se cruza normalmente com a de outras pessoas, independentemente da idade que estas apresentem. Logo o processo de envelhecimento não é algo estático nem tão pouco igualitário mais sim dinâmico, particular, intransferível com realidades próprias e diferenciadas.
O enfermeiro frente ao idoso
A capacidade da pessoa em se adaptar bem ao processo de envelhecimento requer estratégicas positivas para ultrapassar os obstáculos. Dos factores que podem vir a influenciar este processo destacam-se: o ambiente, a educação, os determinantes socioculturais, as condições de saúde a ideia individual de bem-estar. MORIN (13) coloca que não é preciso ressaltar a estrutura complexa do conhecimento sobre o envelhecimento, e diz “ (…) a questão envolve aspectos biopsicosociais da humanidade e de cada um. A sociedade autoriza vários saberes e diferentes disciplinas para tratar do assunto. Há um emaranhado de discursos sobre o assunto. Eles são, ao mesmo tempo, interdependentes – influenciam uns aos outros e independentes – influenciados por uma série de factores que fogem do controle humano”.
O enfermeiro deve incorporar novos conhecimentos para fazer frente aos desafios que o mundo contemporâneo exige. Para isso deve estar motivado e preparado, pois os novos horizontes da enfermagem exigem do profissional responsabilidade e compromisso com essa ciência em desenvolvimento. A busca por um envelhecimento saudável, além de ser um desafio, necessita ser encarado como uma oportunidade visto que a própria disciplina engloba o estudo da resposta humana aos processos de vida. Compreender do idoso como um ser único, envolvido em um contexto próprio, com sua percepção do mundo face as competências adquiridas durante os anos, são alguns pontos que devem ser considerados. Este profissional deve observar e respeitar as capacidades e potencialidades, reforçar aspectos positivos, estimular o auto-cuidado e a auto-estima, tendo em atenção aos factores de risco que normalmente estão sujeitos, identificando precocemente alterações patológicas de forma a intervir para a sua eliminação ou minimização. COLLIÉRE (14) sublinha que mudanças relativas ao envelhecimento requerem cuidados de estimulação e de manutenção das capacidades que a pessoa ainda possui, de modo a prevenir maiores limitações funcionais.
A família é considerada uma unidade onde sentimentos como amor, amizade, acolhimento e apoio são característicos. Isso faz com que a família seja vista como a primeira linha de suporte na prestação de cuidados, e que por isso, deve ser incluída em qualquer plano de acção. O enfermeiro tem procurado ir ao encontro das necessidades de saúde utilizando pilares sólidos e fundamentais da disciplina. A promoção de um envelhecimento activo, a adequação dos cuidados às necessidades específicas, a preocupação com a promoção e o desenvolvimento de ambientes estimuladores da autonomia e independência são questões normalmente abrangidas em seu plano de intervenção.
É comum observar, quando se fala de idosos, a tendência de abordar somente os aspectos negativos, esquecendo-se, na maioria das vezes, os positivos. O idoso tem que ser visto como um sinal de desenvolvimento e prosperidade, um motivo de orgulho para todos. Devemos aproveitar a experiência destas pessoas para encontrar saídas para os inúmeros problemas que a nossa sociedade se confronta. O idoso deve ser considerado um potencial agente de desenvolvimento social e económico, não só pelos anos que já viveu, mais pelo que ainda pode contribuir para transformar o nosso mundo em algo melhor e mais justo.
Para finalizar, envelhecimento é uma realidade neste início de século e tem que ser encarado como um avanço, uma oportunidade no campo social, cultural, económico e político. É um momento singular, pois é rico de experiências individuais que devem ser partilhadas com vistas ao desenvolvimento humano. É importante e necessário que os idosos não sejam mais vistos como um grupo carente e sem interesse social. Chegar aos sessenta e cinco ou oitenta e cinco anos, não significa que a pessoa esteja ultrapassada, que não tenha mais interesse por nada, que tenha que levar uma vida solitária, esquecida e afastada do vínculo social. Muito pelo contrário. A cidadania é adquirida no convívio entre as pessoas e por isso deve ser cultivada e desenvolvida. Logo a exclusão das pessoas mais envelhecidas tem que ser combatida. Ao idoso deve ser garantido as mesmas oportunidades das outras pessoas no que diz respeito aos direitos sociais, espaços de participação política e inserção social. Sendo o idoso parte da família os seus direitos básicos não devem ser diferenciados em relação aos outros membros, pois isso seria uma forma de discriminação produtora de isolamento. O enfermeiro além de repudiar qualquer tipo de acto discriminatório, deve se adequar a essa nova realidade e se preparar para responder as necessidades que essa fatia crescente de nossa sociedade irá exigir. Tem a responsabilidade de aprofundar conhecimentos que favoreça e estimule a auto-estima, o auto-cuidado, a auto-confiança e que garanta a manutenção da saúde e o melhor bem-estar possível, mesmo porque, as pessoas não ambicionam somente viver mais tempo; elas querem respostas para os desafios relacionados a longevidade.
Bibliografia
1 – Organização Mundial da Saúde - Declaração elaborada pelo Grupo de Trabalho da Qualidade de Vida: Organização Mundial de Saúde (2005) Disponível: www.ops.org.br/publicacl
12 - Cadernos de Bioética: Edição do Centro de Estudos de Bioética. Perspectivas da Bioética Humanização, Genética. Ano XI, nº 23, Agosto 2000
13 – MORIN, E. – Introdução ao Pensamento Complexo. Sulina 3ª ed. Porto Alegre. 2007 ISBN 9727713831
14 - COLLIÉRE, M.F. – Promover a Vida. Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, Lisboa 1989.
15 - COLLIÉRE, M – Promover a Vida. Da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. Tradução do Francês Maria Abecasis. 5ª edição. Lisboa: Lidel, 1999. ISB N 272 96-0009-4.
18 - Cadernos de Bioética: Revista Portuguesa de Bioética. Famílias disfuncionais e a lei de protecção de crianças e jovens. Ano XVII, nº 40, Abril 2006
19 - Cadernos de Bioética: Edição do Centro de Estudos de Bioética. Cérebro e Liberdade - Comentários e Notícias. Ed. Coimbra, nº20, Setembro 1999
20 - Cadernos de Bioética: Edição do Centro de Estudos de Bioética. Identidade, Sexualidade, Clonagem. Ano XI, nº 22, Abril 2000.
Para quem não sabe, Pão de Deus é um “doce” ou melhor um “bolo” muito gostoso com coco ralado em cima. A maioria das pastelarias ou confeitarias vendem e não é muito caro. Todos podem comprar. Excepto…
Um casal foi a um supermercado fazer umas mini comprinhas devido estarem completamente no vermelho, isto é, com muito pouco dinheiro.
Chegando na loja escolheram somente os produtos essenciais como: batata, cebola, alho, …essas coisas e foram colocando dentro da cesta. Quando estavam se dirigindo para o caixa, passaram pelo sector Padaria e avistaram um grande e vistoso Pão de Deus.
Parecia muito fofinho, delicioso, maravilhoso…
Olharam um para o outro e com as bocas “cheias d água” começaram imediatamente a contar o pouco dinheiro que tinham e por final acabaram resolvendo levar o magnífico Pão de Deus.
No caminho de casa não falavam de outra coisa, tendo um deles até mesmo sugerido come-lo de imediato, porém o outro, alegando que seria melhor fazê-lo em casa sentado no sofá à ver uma boa TV, não concordou.
Ao chegarem à porta de casa depararam-se com um indivíduo deitado na entrada do prédio, devo dizer que é coisa rara por essas bandas, mesmo porque, a maioria por vergonha costuma se esconder. Muito magro, sujo, com uma sacola igual a que eles carregavam, porém cheia de roupas sujas, olhou para eles e em seguida abaixou a cabeça.
Frente aquela situação e com um jeito só deles, se dirigiram logo ao sujeito e perguntaram:
“ Senhor que fazes aí deitado?”
E o senhor respondeu:
“Eu estou à vossa espera.”
E lá se foi o Pão de Deus.
Agora se pergunta: E aí… o que eles ganharam com isso?
Isso realmente eu não sei. Eu só sei que ambos são muito felizes.
Apesar dessa história verídica parecer um tanto ridícula para muitos em comparação a várias outras, acaba por mostrar que embora vivamos em um mundo de ilusões, dificuldades e injustiças, parece que não custa muito ser um pouco feliz; seja repartindo um pouquinho com aqueles que nada têm ou de qualquer outra forma nem que seja à comer o seu Pão de Deus logo a saída do supermercado.
A oportunidade e a necessidade do ser humano em conhecer lugares diferentes, os compromissos inesperados e urgentes, o trabalho, as viagens de estudo/pesquisa, visitas a familiares e amigos, entre outros muitos motivos levam com que milhares de pessoas se desloquem diária e rapidamente a várias partes deste planeta. O mundo parece que encolhe frente a capacidade de mobilidade das pessoas que é uma característica marcante da sociedade moderna. Contudo, observa-se que devido ao excesso de confiança ou por falta de conhecimento, muitas pessoas tendem observar somente as coisas boas e agradáveis que sonham vivenciar e realizar e esquecem ou descartam os possíveis riscos que podem estar associados.
Os países anfitriões costumam se preparar para receber os seus visitantes da melhor maneira possível e seguem diversas recomendações internacionais de acolhimento e segurança. Todavia, cada destino é marcado por oportunidades e vulnerabilidades o que exige de todos muita atenção e sobretudo prevenção. Estudar previamente o local para onde se quer ir, acredita-se ser uma maneira eficaz de evitar riscos e surpresas desnecessárias. Saber um pouco da cultura local (hábitos/costumes), alimentação e as condições higiénicas, o tipo de alojamento, a temperatura, humidade e o nível de poluição, as doenças mais comuns (endémicas/epidémicas), a qualidade dos serviços de saúde são alguns pontos de extrema importância para qualquer viajante. Muitas agências de viajem fornecem informações nessa matéria, porém, estas tornam-se, muitas vezes, insuficientes devido a sua complexidade. A OMS (1) destaca alguns factores importantes que podem não só determinar a probabilidade de exposição a muitos agentes infecciosos, como também influenciar sobre a necessidade ou não da realização de uma consulta em uma unidade especializada (consulta do viajante): destino da viajem, a sua finalidade e duração, a época escolhida, a conduta e o estilo do viajante.
Todos sabemos que a humanidade tem o seu passado marcado por diversas epidemias que assolaram diferentes países e dizimaram suas populações como é o caso das Pestes (Atenas, Siracusa, Antonina, Negra), Cólera, Varíola, entre outras (2). Mais recentemente observamos episódios de doenças emergentes como é o caso tuberculose resistente, infecções bacterianas agudas, infecções de veiculação hídrica, salmoneloses, entre outras para não falar das infecções víricas que continuam sendo um desafio para a comunidade científica mundial.
Como base nesse passado podemos afirmar que todos temos a responsabilidade de garantir não só à nossa saúde como também a de todos à nossa volta. A OMS (1) cita as responsabilidades de todo o viajante:
Reconhecer e aceitar os riscos.
Buscar aconselhamento de saúde antecipadamente preferencialmente 4 a 8 semanas antes de viajar.
Receber as vacinas recomendadas e obter informações sobre medidas sanitárias.
Fazer atempadamente um planeamento cuidadoso.
Providenciar caso necessário um boletim médico.
Fazer um seguro saúde viajem se possível.
Ser responsável pela saúde e bem-estar de crianças que acompanham.
Adoptar medidas de precaução para evitar transmitir qualquer doença infecciosa a outras pessoas durante e depois da viajem.
Informar as autoridades de saúde sobre qualquer doença no regresso.
Mostrar respeito pelo país anfitrião e a sua população.
Muitas pessoas apresentam doenças pré existentes, normalmente crónicas, que requerem controlo permanente. Recomenda-se que estas pessoas procurarem ajuda para uma avaliação cuidadosa de seu estado de saúde e que solicitem o fornecimento de medicamentos em quantidade suficiente até o seu retorno. É bom lembrar, a importância de levar por escrito informações que evidenciem a patologia, o medicamento e a dose que normalmente consome e recomendações em caso de urgência. A OMS (1) cita algumas doenças, não excluindo outras, nas quais todas as pessoas devem procurar aconselhamento médico antes de viajar:
- Doenças cardiovasculares
- Hepatite crónica
- Doenças intestinais inflamatórias crónicas
- Doenças renais crónicas que requerem diálise
- Doenças respiratórias crónicas
- Diabetes Mellitus
- Epilepsia
- Anemia severa
- Transtornos mentais graves
Algumas vacinas são obrigatórias em alguns países e recomendáveis em outros. Países onde os riscos são significativos torna-se necessário obter um boletim médico onde conste, para além das orientações, as vacinas que foram administradas. A vacinação apesar de ser um procedimento eficaz, não garante protecção contra todos os riscos, mesmo porque, existem doenças nas quais ainda não existe protecção específica, o que reforça a permanente necessidade de medidas de precaução. Segundo a OMS (1) não existe um calendário único de imunização para todos os viajantes. Cada calendário deve ser personalizado e adaptado observando as imunizações anteriores, as características específicas da viajem e o contexto individual. Alerta para que todas as pessoas que apresentem no regresso febre, diarreia persistente, vómitos, transtornos urinários, problemas dermatológicos que procurem imediatamente uma unidade de saúde. Para os portadores de doenças crónicas, citadas anteriormente, esta visita torna-se obrigatória.
Em 2008 a OMS (1;8) disponibilizou uma relação de vacinas: 1) de uso comum na maioria dos países (especialmente em crianças); 2) de uso selectivo para os viajantes (aconselháveis para quem vai viajar para países endémicos) e 3) aquelas que são obrigatórias para a entrada nalguns países:
Actualmente não é exigida como condição de entrada em nenhum país. Contudo, os viajantes de alto risco como trabalhadores de ajuda humanitária entre outros devem receber a vacina ao se dirigirem para regiões endémicas.
Tipo: inactivada; Dose: duas, com intervalo de uma semana; Contra indicação: hipersensibilidade; Reacções adversas: transtornos digestivos leves ocasionais; Administração: três semanas antes da partida
Encefalite Japonesa
Principal causa de encefalite vírica na Ásia. Sua incidência tem aumentado em países como Bangladesh, Índia, Nepal, Paquistão, norte de Tailândia e Vietname. Diminuído no Japão e na península Coreana e em algumas regiões da China.
Tipo: inactivada; Dose: duas, com intervalo de quatro semanas; Contra indicação: hipersensibilidade; Reacções adversas: pode ocorrer reacção cutânea ou sistémica leve e ocasionalmente reacção grave com urticária generalizada, hipotensão e colapso; Administração: no mínimo duas doses antes da partida.
Meningocócica
Actualmente a Arábia Saudita exige a vacina tetravalente (A, C,Y,W-135) as pessoas que visitam Meca anualmente (Hajj) ou em qualquer período (Umrah).
Tipo: Inactivada; Dose: única; Duração da protecção: 3 a 5 anos; Contra indicação: reacção grave a dose anterior; Reacções adversas: reacções locais leves e nalguns casos febre ligeira; Indicação: 2 semanas antes da partida. Observações: obrigatória para os viajantes de Hajj. A vacina não protege crianças menores de 2 anos de idade.
Encefalite por carraças (carrapatos)
Só é recomendada para viajantes de alto risco como aqueles que viajam para zonas infestadas.
Tipo: inactiva; Dose: duas, com 4 a 12 semanas de intervalo e reforço 9 a 12 meses após a última dose; Contra indicação: Hipersensibilidade; Reacções adversas: locais e raramente febre; Administração: segunda dose duas semanas antes da partida.
Hepatite A
Viajantes que partem para zonas de risco moderado a alto e aquelas com alto risco de contrair a doença.
Tipo: Inactivada; Dose: duas, com intervalo de 6 a 24 meses; Contra indicação: hipersensibilidade a dose anterior; Reacção adversa: local ou sistémica leve.
Anti-Rábica
Viajantes que se dirigem para zonas de alto risco. Segundo a OMS calcula-se que 13% dos viajantes do Sudeste Asiático entram em contacto com animais locais.
Tipo: vacina moderna (em cultivo celular ou ovos embrionários); Doses: três; Reacções adversas: pequena reacção local ou sistémica.
Febre Tifóide
Risco elevado especialmente no subcontinente Indiano.
Tipo: Ty21a (oral) e Vi CPS (injectável); Dose: Uma de Vi CPS ou Três a quatro de Ty21a viva, com intervalo de 2 dias e reforço a cada 2 a 3 anos; Contra indicações: Uso de Proguanil, mefloquina e antibióticos 3 dias antes ou depois de começar a administração de Ty21a. Reacções adversas: nenhuma significativa. Indicação: 1 semanas antes da partida. Observações: A Vi CPS não é recomendada para crianças menores de 2 anos de idade.
3)Obrigatória:
Febre-amarela
Muitos países exigem o Certificado Internacional de Vacinação contra a Febre-amarela na travessia de suas fronteiras aos viajantes procedentes de países com risco de transmissão e em alguns casos até mesmo a todos os viajantes. Existem situações em que o trânsito interno (visitas a zonas endémicas) é recomendada a vacinação a qualquer pessoa independente de ser turista ou não. A validade do certificado Internacional inicia após o 10º dia da vacinação e tem duração de 10 anos. Os países de língua oficial portuguesa exigem a vacinação contra a febre-amarela aos visitantes procedentes de zonas de risco. Em Portugal, segundo a OMS, este requisito só se aplica as pessoas que visitam os Açores e a Madeira.
Tipo:Vírus vivos; Dose: única, com reforço a cada 10 anos; Contra indicação: Hipersensibilidade a dose anterior, alergia a proteína do ovo, indivíduos imunodeprimidos; Reacções adversas: raramente encefalite e problemas hepáticos; Observação: não administrar em crianças menores de 9 meses de idade.
Os países que actualmente exigem a todos os visitantes a vacina contra a Febre-amarela na passagem de suas fronteiras são: Angola, Benim, Burkina Faso, Burundi, Camarões, Congo, Costa do Marfim, Gabão, Gana, Guiana Francesa, Libéria, Mali, Niger, República Centro Africana, República Democrática do Congo, Ruanda, São Tomé e Príncipe, Serra Leoa e Togo.
É importante que se diga que para além desses países mencionados acima, existem outros onde o risco de transmissão é evidente em algumas áreas, apesar de não ser exigido a vacinação como condição de entrada: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Etiópia, Gâmbia, Guiné Equatorial, Guiné-Bissau, Quénia, Mauritânia, Panamá, Paraguai, Peru, Senegal, Somália, Sudão, Suriname, Tanzânia, Trinidad e Tobago, Uganda, Venezuela.
Também é bom lembrar que para além destas doenças mencionadas existem muitas outras que infelizmente não existem vacinas para protecção. Estas podem ser transmitidas através dos alimentos, água insalubre, picada de insectos, contacto ou mordedura de animais, ar e solo contaminado, contacto com sangue infectado e através das relações sexuais inseguras. Algumas são conhecidas, outras nem tanto, o que faz com que todas as pessoas tenham que ter obrigatoriamente alguns cuidados. A OMS destaca algumas doenças que não existem vacinas específicas para protecção ou que estas encontram-se indisponíveis na maioria dos países: Dengue – Leptopisrose – Paludismo - Diarreia do viajante - Doença de Lyme (Borrelia burgdorferi) – Burcelose - Carbúnculo (Bacilo anthracis) - Chikungunya (vírus chikungunya) – Hantavírus - Esquistosomose (schistosoma mansoni, japonicum, haematobium) - Febres Hemorrágicas – Filariose – Giardíase - Hepatite C - Hepatite E - Legionolese (legionella) - Listeriose (listeria monocytogenes) – VIH entre outras.
Como vimos, a OMS segue vigiando a evolução das doenças infecciosas, alertando, compartilhando conhecimentos técnicos e articulando respostas necessárias com o intuito de proteger as populações. Em 2005 finalizou o novo Regulamento Sanitário Internacional (RSI) (3;7) que entrou em vigor em Junho de 2007. Este mais abrangente e eficaz acompanha melhor a evolução de todas as enfermidades e os factores que determinam a sua aparição e transmissão a nível mundial. Traz algumas novidades em relação ao RSI de 1969: a obrigatoriedade dos estados em notificar rapidamente a OMS qualquer emergência de Saúde Pública de importância internacional como: eventos de grande repercussão que exigem uma acção imediata; surtos de doença que tenham potencial epidémico independente de natureza, origem ou fonte; eventos incomuns ou imprevistos ou com elevada morbidade e mortalidade; eventos que possam causar restrições ao comércio ou tráfego de pessoas. O novo RSI refere também a obrigação dos estados em instalar um mínimo de capacidades básicas para detecção, avaliação e notificação de riscos em matérias de saúde pública; a autorização, pela OMS, do uso de outras fontes de informação, além das notificações oficiais dos países; melhor vigilância e controlo sanitário bem como melhoria de medidas aplicadas em portos, aeroportos e pontos fronteiriços; recomendação de medidas de saúde pública para o manejo de emergências internacionais. O Regulamento institui um comité de emergências para avaliar os evento e formular, modificar ou prorrogar recomendações rapidamente. Apresenta um comité de revisão, que presta assessoria na formulação de recomendações sobre emendas ao Regulamento e modificações de recomendações permanentes.
A OMS (4) estabelece sete estratégias de trabalho para orientar a aplicação do Regulamento Sanitário Internacional 2005:
1ª - Impulsionar as alianças mundiais que inclui ela própria, os países membros e todos os sectores pertinentes como a saúde, agricultura, transporte, comércio, educação e defesa.
2ª – Fortalecer os sistemas nacionais de vigilância, prevenção e controle.
3ª – Fortalecer a segurança sanitária global dos viajantes e transportes.
4ª – Fortalecer os sistemas mundiais de alerta e resposta da OMS.
5ª – Fortalecer a gestão de riscos específicos.
6ª – Proteger os direitos, obrigações e procedimentos.
7ª – Realizar estudos e vigiar e acompanhar os progressos realizados.
Actualmente o mundo vem sendo muito castigado pela Gripe A, tendo a OMS e parceiros respondido em ritmo acelerado e de forma eficaz. A própria agência coloca que o mundo está melhor preparado para enfrentar o desafio e que é imprescindível continuar aplicando as medidas necessárias no que tange a vigilância, diagnóstico, tratamento precoce e controle da infecção. Alerta para a possibilidade da pandemia vir afectar mais os países pobres, podendo originar elevadas taxas de mortalidade, o que mostra que a evolução da doença vem sendo seguida em tempo real (5).
Frente a tudo que foi referido, não é difícil de imaginar que o papel do enfermeiro neste contexto prende-se a prevenção e ao fortalecimento de comportamentos positivos de saúde que garantam o bem-estar dos indivíduos onde quer que estejam.
O enfermeiro observa com muita atenção as solicitações e recomendações da OMS. No terreno tem procurado orientar as famílias que pretendem viajar para as regiões consideradas de risco, referenciando-as as unidades especializadas (consulta do viajante). No que toca as pessoas portadoras de doenças crónicas que regressam do estrangeiro, estas tem sido avaliadas e encaminhadas de imediato aos seus médicos assistentes consoante as necessidades. Contudo, observa-se que muitos indivíduos/famílias não procuram a consulta do viajante, talvez pela não obrigatoriedade da apresentação de Certificado Internacional de Vacinação para a entrada em muitos países. Todavia, como já foi referido, muitos destinos escondem riscos potenciais, o que gera a urgência de programas educativos de proximidade que reforcem medidas de precaução e protecção tanto para as pessoas que se dirigem para países onde é obrigatória imunização específica, como para muitos outros. Acredita-se que a “saúde do viajante” deva ser uma matéria de domínio de todos os enfermeiros que actuam nas comunidades, principalmente aos que se especializam em Enfermagem Comunitária.
Ao pesquisar diversos sites que mencionam Cursos de Especialização em Saúde Comunitária, constatou-se que alguns não referem em seus planos de estudo uma cadeira específica nesta área. Acredita-se que a inclusão e o aprofundamento dessa temática contribua para que os enfermeiros possam melhor intervir de modo a minimizar os riscos e a importações de doenças, entendendo risco como o simples desconhecimento dos indivíduos. A Ordem dos Enfermeiros (6) é clara quando diz “os enfermeiros encontram-se numa posição única para identificar factores de risco, providenciar informação acerca do modo mais apropriado de gestão desses mesmos riscos e da divulgação dos benefícios da adopção de estilos de vida saudáveis e evitação de comportamentos de risco”.
Para finalizar, o alastramento vigoroso do vírus da gripe A, mostra a vulnerabilidade humana e põe em teste a nossa resistência e capacidade em ultrapassar obstáculos que muitas vezes são consequências da própria acção do homem. A devastação das florestas e a invasão do meio natural dos agentes; práticas de agricultura perversas ao ambiente; a concentração de “riquezas” que deslumbra o homem pouco informado e gera área urbanas super povoadas e bolsas de pobreza e doenças; a poluição atmosférica; as alterações climáticas; mudanças constantes de hábitos de vida e comportamentos, que facilitam a resistência dos microrganismos e dificulta o seu combate; o transporte irresponsável que facilita o rápido deslocamento de agentes e vectores causadores de doenças e o seu aparecimento em lugares nunca vistos são factores, entre muitos, que incomodam os mais conscientes. A contribuição do enfermeiro estende-se para além do tratamento das sequelas daí resultantes, pois tem em suas bases técnico-científicas instrumentos de mobilização e prevenção. Devido a abrangência e importância das questões relacionadas e a capacidade irrefreável de mobilidade das pessoas, torna-se imprescindível a intervenção fundamentada deste profissional, mesmo porque, questões que envolvem a educação/prevenção/protecção da saúde são de sua responsabilidade.
Bibliografia
1 - Organização Mundial de Saúde - Viajes Internacionales y Salud : situación en 1 de enero de 2008. Versão em espanhol. Disponível:
2 - Rezende, Joffre. M - As Grandes Epidemias da História. Disponível:www4.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_908756715.ppt
3 – Organização Mundial de Saúde – Reglamento Sanitário Internacional 2005. Segunda Edición. Versão em espanhol.Disponível: http://www.who.int/ihr/es/index.html
4 - Organização Mundial de Saúde - Áreas de trabajo para su aplicación
7 - Organização Pan-Americana da Saúde - Regulamento Sanitário Internacional – Informações básicas para órgãos normativos e Unidades Federadas. Disponível:
O trabalho faz parte da história da humanidade pois permite que o homem satisfaça suas necessidades, evolua, crie, transforme o meio e usufrua das consequências. Muitos estudiosos consideram-no instrumento gerador de felicidade e bem-estar, um operador indispensável na estruturação do próprio ser. MARX (1) aborda trabalho como sendo “ um processo em que ambos, o homem e a natureza, participam e no qual o homem, de sua livre vontade regula e controla as relações materiais entre si próprio e a natureza. Logo ao actuar no mundo externo e ao modifica-lo ele muda a sua própria natureza”.
O trabalho observado por vários ângulos e perspectivas, como a religiosa, psicológica, filosófica e económica mostra a busca permanente por uma sensação de liberdade, satisfação, uma oportunidade para realizações pessoais, um veículo para se obter uma melhor qualidade de vida. Logo a importância do equilíbrio dentre homem/trabalho/ambiente torna-se fundamental para qualquer conquista. Contudo, esse equilíbrio foi sempre muito perturbado por eventos resultantes de ambientes inapropriados, processos de trabalho desajustados, falta de organização, ausência de pensamento ecológico, ineficácia de medidas de combate aos acidentes e doenças decorrentes do local de trabalho e do processo produtivo. A enfermagem não fica atrás, pois é marcada desde o seu surgimento até os dias de hoje por acidentes e doenças profissionais. Na sua história, para além dos casos não registados, temos o de Florence Nightingale (FN) que no desempenho de suas funções durante a guerra da Criméria, contraiu uma febre que lhe minou as energias (2).
Muitos pesquisadores ligados a Enfermagem do Trabalho colhem vestígios dessa época na tentativa de associar FN a saúde ocupacional. Alguns consideram que o facto de a enfermeira ter cuidado dos soldados, considerados funcionários do Ministério da Guerra na época, e ter tratado de suas feridas, vistas como acidentes de trabalho, contribui para a associação.
Todavia, o surgimento da enfermagem do trabalho é algo ainda obscuro. Existem estudos que evidenciam a inglesa Phillipa Flowerday (1867) como sendo a primeira enfermeira do trabalho. Esta prestava atendimentos aos empregados, não só na fábrica onde trabalhava como também em suas residências. Outras enfermeiras também são consideradas pioneiras na área, como Elisabeth Parry (1858), Betty Moulder (1888) e Ada Mayo Stewat (1895). Os estudiosos acreditam que as lutas e conquistas dessas enfermeiras representam marcos históricos, pois promoveram o surgimento e desenvolvimento da especialidade ao cultivarem o interesse de outras em várias partes do mundo. Bulhões (3), descreve um pouco da evolução da Enfermagem do Trabalho no século passado em alguns países considerados desenvolvidos:
Austrália - Em 1976 foi criado a Associação de Enfermeiros de Saúde Ocupacional da Austrália que se integrou a Federação Australiana de Enfermagem. Abriram-se vários Cursos de Especialização garantindo o desenvolvimento da especialidade na época. Em 1980 o país já contava com 1500 enfermeiros do trabalho actuando em várias empresas.
Estados Unidos – Em 1942 foi fundado a American Association of Industrial Nurses (AAIN). Em 1968 já havia no país 19.500 enfermeiros que exerciam actividades na área da Enfermagem do Trabalho. Em meados de 1976, os enfermeiros já eram responsáveis pela gerência dos programas de saúde ocupacional na quase totalidade das empresas. Por possuírem formação especializada, eram capazes de desenvolver, implementar, avaliar e coordenar a distribuição de assistência à saúde. Aplicavam o processo de enfermagem congruente com as necessidades dos trabalhadores, participavam de programas de educação continuada e de formação, desenvolviam projectos de prevenção de doenças ocupacionais e acidentes de trabalho, tinham habilidades clínicas suficientes e um profundo conhecimento em ciências do comportamento, o que lhes permitiam realizar aconselhamento em saúde mental.
Finlândia - Em 1978 já actuavam no país cerca de 1343 enfermeiros do trabalho e desfrutavam de um grande prestígio devido a sua alta qualificação. Assumiam papel de gerência e desenvolviam diversas actividades como avaliação física e psicológica dos trabalhadores, programas de educação em saúde, assessoria na área segurança, cursos de primeiros socorros, confecção de relatórios, entre outras. Em 1980 a Associação Finlandesa de Enfermeiros do Trabalho já tinha 1200 membros inscritos.
França - O enfermeiro do trabalho têm presença obrigatória nos serviços de saúde ocupacional desde 1946. Em 1969 a legislação Francesa já obrigava as empresas com mais de 500 trabalhadores a terem em seu quadro um enfermeiro do trabalho a tempo inteiro.
Holanda - A Associação Holandesa de Enfermeiros do trabalho foi criada em 1946 e os primeiros cursos de saúde ocupacional surgiram em 1960. Em 1982, já existia cerca de 600 enfermeiros do trabalho que desenvolviam actividades no campo administrativo, assistencial e de ensino.
Reino Unido - Em 1934 eram realizados cursos para “enfermeiros da indústria”. Bulhões (50) refere que a partir de 1952 após reunião do Comité da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Organização Mundial de Saúde (OMS) o curso tornou-se mais completo e se projectou, a partir de então, “ à enfermagem para a saúde dos trabalhadores”. A mesma autora cita Sleney que coloca que o curso “preocupou-se, desde o início, não apenas em preparar os enfermeiros para o novo campo de trabalho, mas, ao mesmo tempo, em garantir através desses cursos, um excelente padrão de assistência de enfermagem e assegurar a satisfação no trabalho nessa especialidade”.
Suécia - Desde 1980 que os enfermeiros de trabalho integram a equipe de saúde ocupacional e desenvolvem suas actividades em estreita relação com os engenheiros de segurança. A Associação de Enfermeiros do Trabalho da Suécia contabilizava 2000 enfermeiros inscritos nesta data. Os cursos de especialização formavam cerca 200 enfermeiros por ano.
BULHÕES (3), menciona também a ocorrência de um seminário sobre formação de Enfermeiros do Trabalho, realizada em 1969 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) onde participaram a OMS, Associação Internacional de Saúde Ocupacional e o Conselho Internacional de Enfermagem. Nesse evento debateram-se as experiências vivenciadas na área por diversos países como: Brasil, Espanha, EUA, Finlândia, França, Grécia, Itália, Noruega, Reino Unido, Suécia e a antiga URSS.
Como podemos notar a Especialização na área Enfermagem do Trabalho é uma realidade, a muito tempo, em muitos países. Considerando que o estudo de Bulhões data de mais de vinte anos e que já foram realizadas diversas Conferências Internacionais desde então, podemos imaginar que muita coisa mudou, e para melhor. Além dos países mencionados, outros como Colômbia, Chile, Argentina, Cuba, Canada apresentam instituições de ensino que ministram cursos de Pós Graduação e/ou Mestrados e Doutoramentos na área. Logo podemos afirmar que a Enfermagem do Trabalho vem aprofundamento conhecimentos através do desenvolvimento de pesquisas que visam fundamentar teoricamente a prática profissional. RASTEIRO (4) com uma visão alargada de saúde coloca “a globalização da Enfermagem do Trabalho passa pela construção de pontes internacionais tais como parcerias e intercâmbios em educação/formação, em investigação, em partilha de experiências profissionais nos vários países”.
A Ordem dos Enfermeiros Portugueses (5) não menciona o curso de Especialização em Enfermagem do Trabalho na listagem de cursos de Pós Licenciatura de Especialização. Em uma página informativa em seu site informa “agora poderá consultar neste espaço as listagens completas de todos os Cursos de Pós Licenciatura de Especialização em Enfermagem que mereceram parecer positivo da Ordem dos Enfermeiros e já têm autorização de funcionamento” e cita: Comunitária; Saúde Infantil e Pediátrica; Médico Cirúrgica; Reabilitação; Saúde Materna e Obstétrica; Saúde Mental e Psiquiátrica. O que nos leva a pensar que ainda não estão criadas as condições necessárias para o surgimento da especialidade. RASTEIRO (4) diz “ vai ser frequente encontrar o Enfermeiro do Trabalho a exercer com enfermeiras/os de outros países ou mesmo continentes (União Europeia, Mercosul) ” e acrescenta “para isso acontecer é necessário que a formação em Enfermagem do Trabalho seja globalmente relevante”.
O II Congresso da Federação de Enfermeiras do Trabalho da União Europeia (6) realizado na cidade de Estrasburgo no ano de 2000, teve como tema central "Europeus: tornando a saúde e o bem-estar no trabalho uma verdadeira parceria". Neste, a enfermeira Janine Bigaignon-Fanchet-te coloca que “ a evolução do trabalho irá exigir dos profissionais de saúde ocupacional a competência necessária para enfrentar as mudanças”. Durante os debates enfatizou-se a necessidade dos Enfermeiros do Trabalho “adquirirem competência e as qualificações necessárias para que possam actuar com segurança no cenário futuro da saúde ocupacional”.
A OMS não deixa dúvidas quando refere “o Enfermeiro do Trabalho está, cada vez mais, a tornar-se um elemento chave na prática da Saúde no Trabalho; é o enfermeiro que, muitas vezes sozinho, assume a inteira responsabilidade pelo serviço de Saúde no Trabalho em alguns lugares.
Bulhões (3), é clara quando diz que a especialidade Enfermagem do Trabalho “é destinada ao cuidado daqueles que trabalham. Sua atenção volta-se para os trabalhadores de todas as categorias e de todos os sectores de ocupação, onde quer que se encontrem. Qualquer destinatário ou receptor desse cuidado profissional, que por acaso aí se acrescente, tais como: família, empresa, comunidade, serão incluídos por força da assistência que se destina e reserva, em primeiro lugar ao trabalhador. Se assim não for, de outra forma, teremos enfermagem em saúde pública, enfermagem em saúde da comunidade, enfermagem em saúde materno-infantil e, não enfermagem em saúde dos trabalhadores”. A American Association of Occupational Health Nurses (AAOHN) (7) define Enfermagem do Trabalho como “ prática especializada que providenciacuidados de saúde aos trabalhadores”. Enfatiza a promoção, protecção e recuperação da saúde dos trabalhadores dentro do contexto de um ambiente de trabalho. Coloca que “a prática da Enfermagem do Trabalho é autónoma e os enfermeiros do trabalho tomam decisões de enfermagem independentes em Serviços de Saúde no Trabalho estabelecidos – o fundamento para a enfermagem do trabalho é baseado na investigação com ênfase na optimização da saúde, na prevenção da doença e acidente e na redução dos riscos de saúde” (7).
Com base no referido conclui-se que a Enfermagem do Trabalho não pode ser absorvida por qualquer outra especialidade visto ser orientada por objectivos que têm como base as necessidades específicas dos trabalhadores com foco no trabalho e no ambiente de trabalho.
No que refere a Enfermagem do Trabalho a legislação Portuguesa - Lei n.º 7/95de29de Março que foi alterada no ano de 2000 referia:
Artigo 23;Alínea 5: “O médico e o enfermeiro do trabalhoexercem as suas funções com independência técnica eem estrita obediência aos princípios da deontologia profissional”. Alínea 6: “Considera-seenfermeiro do trabalho o enfermeiro com o curso deestudos superiores especializados deEnfermagem de Saúde Pública com formação específica no domínio de saúde no trabalho”. Alínea 7: “ No caso de insuficiência comprovadadeenfermeiros do trabalho qualificados, nos termos referidos no número anterior, poderão ser autorizados pela Direcção-Geral da Saúde a exercer as respectivas funções enfermeiros com o grau de bacharel, os quais, no prazo de cinco anos a contar da respectiva autorização, deverão apresentar o diploma deestudos superiores especializados previsto no número anterior, sob pena de lhes ser vedada a continuação do exercício das referidas funções.
Cinco anos mais tarde, o Decreto-Lei nº 109/2000 de 30 de Junho de 2000 DR 149 - SÉRIE I-A que alterou a Lei anterior refere:
Artigo 16º; Alínea 6: “Nas empresas cujo número de trabalhadores seja superior a 250, no mesmo estabelecimento, ou estabelecimentos situados na mesma localidade ou localidades próximas, o médico do trabalho, na realização dos exames de saúde, deve sercoadjuvado por um profissional de enfermagem com experiência adequada.
Em Fevereiro de 2001, no documento “Conselho Económico e Social – Comissão Permanente de Concertação Social”, página 16 (item 2), o termo “Enfermeiro do Trabalho” volta a aparecer, porém, por pouco tempo pois a Lei nº 35/2004 de 29 de Julho no Artigo 246torna surgir a expressão “ (…) coadjuvado por um profissional de enfermagem com experiência adequada”.
Ao pesquisar sites de enfermagem constata-se que muitos enfermeiros não compreendem essas diferenças.
Em um trabalho apresentado no III Congresso de Enfermagem do Trabalho (8) realizado em São Paulo/Brasil em 2008, é referido “a Associação Nacional dos Enfermeiros do Trabalho Portugueses (ANET), reajustou a definição de Enfermeiro do Trabalho e propôs, através da Ordem dos Enfermeiros de Portugal, que o âmbito de acção e o estatuto destes profissionais se encontrem claramente delimitados e regulados através de diplomas legais, ao contrário do que acontece actualmente”.
O Plano de Acção Mundial sobre a Saúde dos Trabalhadores 2008-2017 (9) estabelece um marco normativo que permite a implementação de medidas para proteger, promover e melhorar a saúde de todos os trabalhadores. Realça que todos os trabalhadores devem usufruir de condições favoráveis a saúde, que proporcionem o mais alto nível de bem-estar físico e psicológico nos ambientes de trabalho. É claro quando coloca que os trabalhadores representam a metade da população mundial, apesar de somente uma pequena minoria desfrutar de serviços ocupacionais, e são os maiores colaboradores para o desenvolvimento económico e social. Salienta a importância de se estar atento para os aspectos positivos e negativos proveniente da mobilização cada vez maior de pessoas, produtos e tecnologia. Alerta para a necessidade de todos os componentes dos sistemas de saúde estarem preparados para dar as respostas adequadas aos problemas dos trabalhadores. Destaca cinco objectivos que devem ser perseguidos:
1 - Elaborar e aplicar instrumentos coerentes a saúde dos trabalhadores.
2 - Proteger e promover a saúde no local de trabalho.
3 - Melhorar o funcionamento dos serviços de saúde ocupacional.
4 - Proporcionar dados para fundamentar as actividades e as práticas.
5 - Integrar a saúde dos trabalhadores a outras políticas.
Juan Somavia, directora geral da OIT, afirmou recentemente que o trabalho em condições inseguras “é uma autêntica tragédia humana” e alertou “a segurança e a saúde no trabalho constitui um direito humano e ambos são parte integrante do programa de desenvolvimento centrado nas pessoas” (10).
Ao nível europeu a comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões (11) propõe uma nova estratégia intitulada “Melhorar a Qualidade e a Produtividade do Trabalho, estratégia comunitária para a saúde e a segurança no trabalho 2007-2012” concretizada no Parlamento Europeu em Janeiro de 2008. O documento analisa as estratégias anteriores e sinaliza os aspectos positivos e os que ainda precisam melhorar. Propõe a criação de um quadro normativo moderno e eficaz para se atingir um objectivo ambicioso - reduzir em 25% da taxa total de incidência de acidentes no trabalho na UE-27 até 2012. Destaca a necessidade de reforçar a protecção da saúde e a segurança dos trabalhadores, enquanto factor determinante para o êxito da estratégia de crescimento e emprego. Cita um conjunto de medidas fundamentais para atingir o objectivo:
I.Garantir e apoiar a correcta aplicação da legislação.
Destaca em conjunto de instrumentos que garantam o respeito pela legislação: Divulgação de boas práticas a nível local; Formação dos empresários e dos trabalhadores; Desenvolvimento de instrumentos simples para facilitar a avaliação de riscos; Divulgação, em linguagem simples, de informações e orientações de fácil compreensão e execução; Difusão mais eficaz das informações e melhor acesso a serviços de aconselhamento; Acesso a serviços externos de prevenção de alta qualidade e a preços acessíveis; Envolvimento dos inspectores do trabalho como intermediários para promover um melhor cumprimento da legislação.
II.Adaptar o quadro normativo à evolução do mundo do trabalho e favorecer o desenvolvimento e a execução de estratégias nacionais.
Acompanhamento de sectores que apresentem resultados pouco satisfatórios em matéria de redução de acidentes e doenças profissionais.
III.Incentivar as mudanças de comportamento dos trabalhadores e encorajar os empregadores a adoptarem abordagens favoráveis à saúde.
Desenvolvimento de programas de educação e formação para os trabalhadores garantindo os conhecimentos necessários para que desempenhem suas actividades com segurança. Adopção de medidas para promover a reabilitação e reinserção dos trabalhadores.
IV.Definir os métodos para a identificação e a avaliação de novos riscos potenciais.
Realça a investigação como arma para melhor combater riscos e agravos a saúde dos trabalhadores. Destaca as questões psicossociais e uma série de afecções que necessitam serem melhor investigadas. Coloca que actualmente os problemas associados a saúde mental representam a quarta causa mais frequente de afastamento do trabalho.
V.Melhorar o acompanhamento dos progressos realizados.
Criar instrumentos de acompanhamento adequados para que o objectivo seja seguramente alcançado.
VI.Promover a saúde e segurança a nível internacional.
Em Portugal a resolução do Conselho de Ministros nº 59/2008 de 1 de Abril aprovou a Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho para o horizonte temporal 2008-2012 (12). Destaca objectivos operativos e acções a desenvolver alicerçados em dois eixos fundamentais de desenvolvimento:
1- Desenvolvimento de políticas públicas coerentes e eficazes, resultado da articulação entre os vários departamentos da Administração Pública e que funcionem como motor de mobilização da sociedade em torno de uma questão social e económica fundamental para a coesão social e que diz respeito à sociedade no seu todo.
2- Promoção da segurança e saúde nos locais de trabalho, como pressuposto de uma melhoria efectiva das condições de trabalho.
Objectivos:
a) Desenvolver e consolidar uma cultura de prevenção entendida e assimilada pela sociedade.
b) Aperfeiçoar os sistemas de informação no domínio da segurança e saúde no trabalho.
c) Incluir, nos sistemas de educação e investigação, abordagens no âmbito da segurança e saúde no trabalho.
d) Dinamizar o Sistema Nacional de Prevenção de Riscos Profissionais;
e) Melhorar a coordenação dos serviços públicos que exercem competências no domínio da segurança e saúde no trabalho.
f) Concretizar, aperfeiçoar e simplificar normas específicas de segurança e saúde no trabalho.
g) Implementar o modelo orgânico da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT).
No âmbito do desenvolvimento da prevenção de riscos laborais:
h) Promover a aplicação efectiva da legislação de segurança e saúde no trabalho, em especial nas pequenas empresas.
i) Melhorar a qualidade da prestação dos serviços de segurança e saúde no trabalho e incrementar as competências dos respectivos intervenientes.
j) Aprofundar o papel dos parceiros sociais e implicar empregadores e trabalhadores na melhoria das condições de trabalho nas empresas.
Enfermagem do Trabalho é uma especialidade que esta em plena ascensão em diversos países do mundo, pois reúne um conjunto de conhecimentos, fundamentações e práticas voltadas para valorização do trabalhador. Busca a protecção, prevenção e manutenção da saúde, reabilitação funcional e reinserção laboral. Prepara o enfermeiro para desenvolver acções na área da organização e administração dos serviços ocupacionais de saúde (gerência de serviços); vigilância à saúde; assistência de campo, onde os eventos específicos acontecem e se manifestam, no ambulatório e/ou em situações de emergência; cria condições para o aperfeiçoamento e implementação de planos e programas de educação/promoção em saúde e de prevenção de agravos aos trabalhadores, observando, para além das capacidades psicofisiológicas do ser humano, os aspectos socioculturais e ambientais; possibilita o planeamento e execução de projectos baseados em dados oriundos da investigação dos enfermeiros.
A especialização faculta também uma visão alargada da saúde e permite uma melhor compreensão das relações entre o trabalho e o processo saúde/doença. Proporciona o fortalecimento do trabalho multiprofissional, valoriza o espaço multidisciplinar e combate a fragmentação de intervenções que nada ou pouco ajudam. Promove o envolvimento dos trabalhadores nas questões da saúde e segurança, através de ferramentas que estimulam o conhecimento e comportamentos laborais seguros. Fornece aos enfermeiros subsídios para melhor planejar, propor e executar acções integradas através de mecanismos interdisciplinares e contribui para um maior entendimento de conceitos como cuidado/pessoa/saúde/ambiente de forma a adaptar o trabalho ao homem e vice e versa.
Para finalizar, as preocupações e as necessidades sentidas em matéria de saúde e segurança no trabalho decorrentes das estratégias citadas, reforça a necessidade de se ampliar a contribuição dos enfermeiros na produção de conhecimentos na área da saúde do trabalhador. Essa produção de conhecimentos científicos esta intimamente ligada a existência e ao reconhecimento de cursos de especialização e mestrados na área, como também ao incentivo que deve ser dado a investigação em todos os níveis, inclusive nos doutoramentos.
Bibliografia
1 – MARX, Karl; Engels, Friederich – O capital, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. 1990
As novas tecnologias de informação e comunicação vieram facilitar a socialização de conhecimentos pois permitiram reduzir a distância entre os povos e potencializaram o intercâmbio cultural. Contudo, algumas das experiências de vida difundidas acabam sendo de difícil aplicabilidade, visto não serem congruentes as circunstâncias de quem as recebe. No caso da saúde isso pode ser demonstrado se considerarmos duas pessoas com o mesmo diagnóstico, que, apesar disso, irão sempre necessitar de orientações e intervenções diferenciadas. Logo podemos afirmar que cada pessoa é um ser único, particular, envolvido em seus próprios problemas, pensamentos, sentimentos, experiências, percepções e ambientes. O que nos leva a pensar que as respostas devam ser personalizadas frente as necessidades de cada um e ao momento em que se vive.
Actualmente a educação em saúde assume desse entendimento pois compartilha possibilidades, respeita o direito de escolha e o potencial de cada um e observa a realidade individual. O que se traduz em um processo responsável, debatido, atencioso que assenta e fundamenta-se numa “ (…) educação multicultural, ética e transformadora (…) (1) ” que vai ao encontro dos fenómenos que afligem as pessoas à fim de lhes proporcionar o melhor bem-estar possível.
Durante muito tempo a saúde foi abordada e fundamentada em um modelo biológico, centrado na queixa/doença, onde acções curativas predominavam e acabavam por se transformar em indicadores de medida. O indivíduo era dividido em partes e só era observado a parte afectada ou a sintomatologia que se associava a uma determinada doença. A educação para saúde seguia a mesma linha, pois se prendia na transmissão de informações ou recomendações baseadas no poder técnico, não respeitando a individualidade, a dimensão social nem tão pouco os determinantes culturais. O indivíduo não era totalmente envolvido no processo educativo, sendo obrigado à assumir o papel de “objecto”, apesar de se tratar de sua própria vida.
Infelizmente ainda presenciamos essa prática em muitos locais. Os seus seguidores insistem em adoptar uma ideologia individualista, que exclui o indivíduo e desvaloriza a influência dos factores sociais e ambientais na determinação e estruturação dos problemas de saúde. Acreditam que todos os indivíduos vivenciam os mesmas componentes estruturais e que por isso, apresentam as mesmas capacidades para alterar os tão famosos “comportamentos insalubres”, bastando para isso que adquiram as informações necessárias. Consideram que os comportamentos “não saudáveis” são os principais responsáveis pelo surgimento de doenças, e acham, que combatendo-os simplesmente, resolverão o problema.
Verifica-se que os defensores da ideologia individualista sustentam uma educação em saúde assentada na supremacia exagerada do conhecimento técnico frente ao saber popular/experiência de vida. Face a essa arrogância despropositada, observa-se que algumas pessoas deixam de colocar suas dúvidas e ideias sobre determinados assuntos, até porque já sabem que estas correm o sério risco de serem totalmente desconsideradas e contestadas e que o suposto “dono da razão”, não conseguirá fornecer respostas aceitáveis para resolução de seus problemas.
Paulo Freire (1) considera que a Educação em Saúde “ do ponto de vista dominante e tradicional é uma área de saber técnico, ou seja, uma organização dos conhecimentos das ciências sociais e da saúde voltada para “instrumentalizar” o controlo dos doentes pelos serviços e a prevenção de doenças pelas pessoas”.
É imperativo acabar com essa estranheza e promover um trabalho verdadeiramente de parceria. Torna-se urgente que alguns profissionais aceitem o seu papel de facilitador no processo educativo, que pode ser iniciado com o simples “desfardamento técnico” frente a nudez pura e simples de muitos. Em outras palavras, é necessário que estes tenham a percepção que não são totalmente suficientes frente à actual produção social da própria doença. Entende-se que o discurso tecnicista e rígido deva ser substituído por outro que promova a troca de ideias (diálogo) e que respeite e inclua verdadeiramente os indivíduos, até porque e segundo a linguagem popular: “é mais fácil confiar no vizinho do que num estranho”.
Rice e Candeias, citados por PEREIRA (2), colocam que “muitos profissionais de saúde, erradamente, acreditam que o papel da educação para a saúde limita-se apenas à reprodução de conhecimento técnico e julgam que apenas com este enfoque poderá mudar o comportamento dos indivíduos e alterar suas práticas tradicionais de saúde”, o que de facto, já se sabe, não ocorre.
Apoiado nesse pensamento considera-se ser necessário um modelo de educação em saúde que propicie a oportunidade de fazer com que os indivíduos busquem, dentro de sua realidade, alternativas favoráveis as mudanças necessárias. Uma prática que inclua os indivíduos, aprecie suas capacidades, estimule a procura das causas e analise as suas implicações com o intuito de ajuda-los a enfrentar os problemas. Um modelo simples, prático, que valorize a realidade dos indivíduos, “ (…) suas vivencias e experiências, seus saberes e conhecimentos objectivando o desenvolvimento cognitivo, crítico e autónomo (…) ” (3), a fim de proporcionar uma educação para a saúde assentada e fundamentada em uma política de confiança e respeito mútuo.
A enfermagem tem procurado adequar suas práticas de acordo com as rápidas transformações sociais. Tem trilhado caminhos em busca de processos de educativos contextualizados, isto é, baseados em uma prática integrada à dinâmica do dia-a-dia das pessoas, na tentativa de alargar horizontes, promover o intercâmbio de saberes e facultar mecanismos eficazes de crescimento não só para os indivíduos, como também para os enfermeiros.
Diversos pesquisadores de enfermagem têm utilizado o Modelo Pedagógico da Problematização. Este modelo foi criado por Paulo Freire, que, apesar de não ser um enfermeiro, muito tem contribuido para o desenvolvimento da profissão.MIRANDA (1)refere que “ (…) o pensamento de Freire tem colaborado de forma significativa na construção de uma educação reflexiva na enfermagem, incorporando uma educação crítica e problematizadora, tendo como leitmotiv o diálogo com seus educandos (…) ”. Apesar de o autor referir-se aos alunos de enfermagem, acredita-se que este modelo possa ser utilizado no terreno da prática pelos enfermeiros.
A Teoria da Problematização contrapõe o ensino tradicional e propõe um ensino diferenciado, pois problematiza a realidade e busca de soluções, possibilitando o desenvolvimento do raciocínio crítico. Esta teoria encontra “ (…) muitos dos pressupostos de sua prática nas correntes filosóficas fenomenológicas e existencialistas” (4). Logo apresenta uma natureza transformadora, “ (…) na medida em que problematiza o conhecimento adquirido, confrontando-o com a realidade, de modo a verificar como esses conhecimentos podem contribuir para explicar, interpretar ou modificar o mundo que nos cerca, encontrando novas aplicações em todos os sectores da vida social” (4;7).
Paulo Freire mostra uma educação voltada para uma sociedade que “ (…) ouve, pensa, fala, sente e se comporta de formas diferentes”. Evidencia uma educação “emancipadora, dialogada, continuada, sem arrogância e predomínio do educador, defendendo a articulação do saber, conhecimento, experiências de vida, comunidade, meio ambiente, traduzindo-se em um trabalho colectivo”. Propõe a possibilidade de uma pedagogia fundamentada na prática, “inserida numa política de esperança, de amor e de fé no ser humano”.
Tem sido usado o esquema intitulado Método do Arco, para ajudar a explicar a Metodologia da Problematização como um “processo que privilegia a troca de conhecimentos, de saberes e de experiências entre os educandos e o educador, considerando que ambos apresentam uma história individual – colectiva – e um contexto social compartilhado” (2).
O Metodologia da Problematização apresenta cinco etapas:
1ª – Observação da Realidade – Caracteriza-se por uma observação cuidadosa dos problemas colocados pelo indivíduo, procurando identificar factores relacionados que possam estar subjacentes. Nesta fase é feita uma reflexão crítica junto com o sujeito acerca dos problemas levantados para posterior problematização. SCHAURICH (2) acrescenta e diz “ (…) neste momento que se torna oportuno aos educandos e ao educador lançar um olhar atento e crítico ao vivido (…) ”.
2ª - Ponto-chave - Momento de síntese e de definição dos problemas fundamentais que serão aprofundados junto do indivíduo. É importante questionar quais as possíveis causas; os determinantes contextuais; os componentes e seus desdobramentos. Para SANTOS (5) esse momento é importante para seleccionar pontos essenciais que deverão ser estudados.
3ª – Teorização – Após os problemas serem identificados, o enfermeiro nesta fase analisa-os de vários ângulos, à fim de fundamentar as futuras propostas para a resolução dos problemas. SCHAURICH (2) refere que esta fase possibilita um ampliar de horizontes teóricos, um aprofundar de conhecimentos acerca do problema.
4ª – Formulação de Hipóteses de Solução – É o momento de encontrar alternativas e elaborar propostas para a resolução dos problemas. Nesta fase incentiva-se a participação, visto que na maioria das vezes, é o indivíduo que será responsável pela implementação das acções futuras. Para SCHAURICH (2) esta fase “tem como premissa a criatividade inerente ao indivíduo como ser inacabado. Este olhar/agir criativo e reflexivo, propicia aos educandos e educador uma percepção do problema, de sua génese, de seu entorno e repercussões individuais e colectivas”.
5ª Aplicação na Realidade Prática – Esta etapa se resume na acção que deve ser executada ou encaminhada na prática. BERBEL (6) refere que as hipóteses são construídas como resultado do estudo e da compreensão pormenorizada dos problemas.
Para concluir, é importante que os profissionais considerem a educação para saúde algo indissociável das actividades desenvolvidas no dia-a-dia profissional; que promovam uma educação em saúde voltada para capacitação dos indivíduos, humanização dos cuidados e valorização da cidadania; que estejam atentos e observem se suas acções estão adequadas a realidade social, económica e cultural dos indivíduos; que tenham consciência do notório esgotamento das dinâmicas essencialmente curativas que, na maioria das vezes, tornam-se pouco resolutivas; que realizem um trabalho verdadeiramente de parceria; e finalmente, que na formação desses técnicos de saúde seja incutido o compromisso com posturas acolhedoras e de construção da autonomia das pessoas e comunidades.
3 –SCHAURICH, Diego; (et.al) – Metodologia da Problematização no Ensino em Enfermagem: uma reflexão do vivido noPROFAE/RS. Escola Anna Nery R Enferm 2007 Jun. 11 (2): 318 - 24. Consulta 2009-04-20 Disponível: http://www.portalbvsenf.eerp.usp.br/pdf/ean/v11n2/v11n2a21.pdf
4 – GUEDES, Bianca Nunes; Maria Iracema Tabosa da SilvaI, Cesar Cavalcanti da SilvaII - A metodologia da problematização na Escola de Posturas da UFPB: um processo emancipatório na prática da educação gerontológica. Revista Electrónica de Enfermagem, v. 09, n. 02, p. 298 - 314, 2007. Disponível: http://www.fen.ufg.br/revista/v9/n2/v9n2a02.htm
5 - SANTOS, Anaide Mary Barbosa; (et.al) - A Pedagogia da Problematização como Prática Emancipatória da Formação em Enfermagem. Consulta 2009-04-20 Disponível: www.cbcenf.com.br/anaiscofen/anais7.asp?edicao=7
6 - BERBEL. Neusi Aparecida Navas - A Problematização e a Aprendizagem Baseada em Problemas: diferentes termos ou diferentes caminhos? Revista Comunicação, Educação, Saúde, São Paulo, v. 2, n.2, p. 139-154, 1998.
10- Organização Mundial de Saúde (OMS) – Cuidados de Saúde Primários Agora Mais que Nunca. Relatório Mundial de Saúde 2008. Consulta 2009-04-24 Disponível: http://www.who.int/whr/2008/whr08_pr.pdf
Este artigo procedente de uma revisão bibliográfica evidencia o cuidador familiar como o principal responsável pelo cuidado ao nível domiciliário. Traça o seu perfil e aborda os principais motivos que normalmente fazem com que uma pessoa assuma tal papel. Descreve sentimentos e necessidades experimentados consoante os estudos realizados. Finalmente faz uma análise do sistema formal de saúde e conclui com algumas recomendações.
Este artículo procedente de una estudio bibliográfico revela al cuidador familiar como siendo el principal responsable del cuidado a nivel domiciliario. Hace una identificación del cuidador y describe los principales motivos que normalmente hacen que una persona asuma tal papes. Describe sentimientos y necesidades vivenciadas por los cuidadores familiares de acuerdo con estudios realizados. Finalmente, hace un análisis del sistema formal de salud y concluye con algunas sugerencias.
Uma das principais características deste início de século é o envelhecimento da população, fruto de um aumento significativo da esperança de vida. Esse facto torna-se relevante na medida que causa um aumento da demanda social e económica devida esta população necessitar de uma maior atenção por parte não só das autoridades de saúde, como também de suas famílias.
A ONU estima para os próximos 20 anos, um aumento de 300% nas necessidades em cuidados de saúde da população idosa. Paralelamente a isso espera-se um aumento acentuado da prevalência de doenças não transmissíveis e de evolução prolongada que deverão reclamar por políticas de saúde que prestigiem mais apoios à assistência domiciliária.
Actualmente, devido a sobrecarga do sistema de saúde, observa-se uma tendência para se diminuir ao máximo possível o tempo de permanência dos indivíduos nas unidades de saúde e para transferir muitos cuidados, que dantes eram tidos como hospitalares, para os serviços de apoio a comunidade e com isso para as famílias. COLLIÉRÈ (1999), refere que a família é o eixo dos cuidados “ (…) que detém em si próprio um valor terapêutico”. Por ser uma unidade viva, é nesta que se encontra o maior número de cuidadores informais, destacando-se as mulheres, pois desenvolvem este ofício desde o início da humanidade.
A insistência por um modelo biomédico centrado na doença, deixa de lado aquele que mais assiste ao doente “o cuidador”, pois não permite que o seu trabalho tenha a visibilidade merecida e todo o apoio necessário. Cabe a Enfermagem, à responsabilidade pelo aprimoramento e desenvolvimento de acções que sejam verdadeiramente centradas na família, tendo em conta o seu contexto.
Tendo o cuidador familiar como o principal responsável pela assistência ao nível domiciliário, este trabalho traça o seu perfil, descreve sentimentos, dificuldades, necessidades e recomenda algumas acções que devem ser realizadas pelo sistema formal de saúde.
Perfil e os motivos que levam a ser um cuidador
Os cuidadores familiares desempenham um papel crucial, pois assumem a responsabilidade em cuidar do familiar. A maioria são do sexo feminino, normalmente esposas, filhas ou filhos que desempenham o papel preponderante no resgate do cuidar. Apresentam geralmente nível educacional baixo e se situam em faixas etárias próximas das pessoas que cuidam, o que explica o facto de grande parte desses cuidadores ser os cônjuges.
Quando fala-se de cuidador familiar, faz-se referência a uma pessoa adulta, que realiza e proporciona as actividades de vida diária, procurando minorar ou até mesmo suprir o deficit de auto cuidado da pessoa que cuida.
Os motivos que levam com que o familiar seja o cuidador principal são na generalidade: a disponibilidade de tempo para o fazer, o sentimento de obrigação e de dever e a solidariedade. CALDAS (1995), coloca que os factores que influenciam o familiar a assumir a responsabilidade do cuidar são: a influência histórica, os imperativos culturais e os preceitos religiosos.
É comum verificar que muitas pessoas aceitam, de forma súbita e inesperada, o papel de cuidador sem que para isso tenham se preparado adequadamente ou pensado seriamente no assunto. Estas pessoas, em um acto impulsivo, assumem ou sem perceber vão arcando com pequenos cuidados e quando se dão conta já estão completamente envolvidas e comprometidas com a situação. FERNANDES (2002), relata que na maioria das vezes a pessoa assume um papel que lhe é imposto pelas circunstâncias e não por escolha própria, apesar de reconhecer que esta missão naturalmente seja sua.
Sentimentos / Dificuldades
O planeamento de alta é extremamente importante e deve ser aplicado a todos os cuidadores. Porém, infelizmente observa-se situações em que este instrumento é mal aplicado ou simplesmente inexiste, o que gera dificuldades e sentimentos de incerteza. CONNEL e BAKER (2004), colocam que muitos cuidadores acabam por experimentar um elevado grau de incerteza quanto ao próprio planeamento dos cuidados e que por isso, utilizam algumas estratégias de coping na tentativa de ultrapassar os obstáculos. No que refere as estratégias citam: 1) manutenção de uma atitude positiva; 2) adaptação à mudança; 3) comparação com os outros; 4) mudanças no trabalho; 5) o humor; 6) o suporte de familiares e amigos próximos. Já RODRIGUES; et al., (1999), em um estudo com cuidadores familiares de idosos com sequelas de AVC, identificou uma diversidade de sentimentos experimentados pelos cuidadores no decorrer do processo de cuidar como o carinho, amor, indignação pela situação, o prazer, a pena, a tristeza entre outros.
O cuidador familiar tende a valorizar em primeiro lugar as necessidades da pessoa que cuida, deixando para um segundo plano as suas próprias necessidades. Muitas vezes, após assumir a responsabilidade do cuidar, experimentam dificuldades/necessidades como: a pouca ou nenhuma informação a cerca da doença, dúvidas quanto a prestação de cuidados, falta de recursos e de apoio económico além das relacionadas ao suporte emocional.
O planeamento de alta permite ao familiar obter informações importantes durante o processo de hospitalização, facilitando a planificação do regresso a casa e o processo de transição. Porém, o enfermeiro deve ter atenção alguns pontos como DRISCOLL, A (2000), coloca bem: 1º) a percepção da informação por parte do cuidador; 2º) a suficiência dessa informação; 3º) a devida utilização dessa informação. Quanto ao primeiro ponto é importante a realização de um planeamento adequado a cada situação específica e de acordo com as necessidades sentidas. No que diz respeito ao segundo, é imprescindível que os cuidadores recebam informação suficiente para que se diminua a ansiedade e a probabilidade de complicações domiciliares. E finalmente quanto a utilização da informação, que esta gere cuidados domiciliares mais eficazes e que contribua para redução do número de readmissões e do tempo de permanência dos doentes ao nível hospitalar.
Um outro ponto a ter em conta é a sobrecarga que o cuidador vive devido aos factores geradores de stress e ansiedade. Esta sobrecarga pode estar ligada a uma dimensão objectiva como é o caso dos acontecimentos e actividades concretas como a dependência económica, mudança na sua rotina, a falta de tempo para si mesmo, entre outros ou a uma dimensão subjectiva que inclui os sentimentos de culpa, de vergonha, baixa auto-estima e a preocupação excessiva com o familiar doente.
O cuidador que se dedica ao cuidar de uma pessoa totalmente dependente sem qualquer tipo de apoio formal, tende a vir a sofrer desgastes físicos e emocionais consideráveis, provenientes da sobrecarga imposta principalmente quando o doente assistido apresenta além de incapacidade física algum deficit cognitivo. MAROTE; et al (2005), dá exemplos de alguns sinais de desgaste físico referenciados pelos cuidadores: lombalgias, cansaço físico, hipertensão arterial, anorexia, cefaleias, entre outras. Refere também a ocorrência de alterações no sistema imunológico para além de problemas como fadiga crónica, alterações cardiovasculares, depressão e ansiedade em níveis superiores aos da população em geral.
Sistema Formal / Informal
A procura por parte do cuidador as unidades de saúde ocorre, em muitos casos, em momentos de extremo sofrimento. Os técnicos de saúde devem estar atentos e procurar investigar a possibilidade da relação entre os motivos desta procura e o possível desgaste físico e mental proveniente do processo de cuidar. Contudo, na maioria das vezes, o modelo biomédico aplicado impede que seja detectado a verdadeira razão dessa procura e o seu real estado de saúde, pois se limita simplesmente ao tratamento sintomático do problema.
A ineficácia dos programas públicos de saúde de atenção ao domicílio não só trás graves prejuízos a todo o sistema como também a grande massa de cuidadores.MONIS; et al., (2005), relata que o cuidado formal de saúde prestado no domicílio “não é mais de que a ponta do iceberg no qual o sistema informal constitui um verdadeiro sistema invisível de cuidados de saúde.”
O enfermeiro deve observar a família como uma unidade, um grupo e não como uma simples soma de pessoas. Deve entender que qualquer alteração em um de seus membros pode repercutir no funcionamento do grupo como um todo. Durante a visita domiciliar deverá estar atento não só ao doente como também ao seu cuidador, ambos inseridos em um contexto próprio e envolvido em relações sociais e afectivas. CRESPO e LOPEZ (2007), ressaltam que é importante que os profissionais, inclusive o enfermeiro, desenvolvam e incentivem vários tipos de intervenções com a finalidade de salvaguardar a integridade física e emocional dos cuidadores e citam: 1º) apoios formais mediante serviços comunitários de alívio; 2º) programas psicoeducativos; 3º) formação de grupos de ajuda mútua; 4º) intervenções psicoterapeutas; 5º) combinações das anteriores. Já PERA (2000), sugere outras medidas que também devem ser incentivadas: 1ª) proporcionar formação adequada dos cuidadores objectivando a melhoria dos cuidados prestados, prevenção de lesões e redução do stress; 2ª) fornecer informação sobre técnicas de planeamento com a finalidade de gerir melhor o tempo: 3ª) identificação, diagnóstico e tratamento imediatos de problemas por parte dos profissionais; 4ª) proporcionar opções de escolha (sistemas de apoio) para que em momentos de dificuldade o cuidador possa recorrer e buscar a ajuda necessária e sem demora.
É importante adequar a aplicação de qualquer programa as necessidades das pessoas. Uma das estratégias é a de envolver as famílias nos cuidados prestados ao nível hospitalar, numa tentativa de capacita-las para a futura transferência do doente para o domicílio, facto já observado em muitas unidades de saúde. Porém, não deixa de ser imprescindível mais investimentos em políticas de intervenção comunitária onde os profissionais possam desenvolver planos de saúde de interesse das famílias, onde o conjunto de acções não foquem somente a pessoa dependente mais também o seu cuidador.
Conclusão
O cuidador familiar representa a base do cuidar no domicílio, pois apesar da pouca visibilidade é ele que assegura a grande parte da assistência a esse nível. Estudos mostram que a grande maioria tem nível educacional baixo, são do sexo feminino e não recebem qualquer tipo de remuneração pelo que fazem. Os motivos que levam as pessoas a serem cuidadores familiares são o sentimento de obrigação e solidariedade, os factores históricos e culturais e o simples facto de não existir uma outra opção.
Existe uma tendência cada vez maior para se transferir o cuidar para o domicílio responsabilizando assim as famílias. Verifica-se que, em muitas ocasiões, essa transferência não é acompanhada com a devida avaliação quanto as condições dos familiares para que o recebimento do doente dependente seja feito sem qualquer tipo de risco. Alguns estudos destacam a importância das unidades hospitalares e outras à nível comunitário se organizarem no sentido de planear melhor a transferência do doente para o domicílio e para o desenvolvimento de programas de formação para cuidadores em diversas áreas.
Dentre as estratégias sugeridas verificou-se: a criação de um serviço comunitário de alívio, onde o cuidador possa fazer pausas de descanso sempre que necessitar; o fornecimento de formação e informação suficiente aos familiares, maior investimento em políticas de intervenção comunitária que garantam a integridade física e psicológica dos cuidadores.
Referenciais Bibliográficas
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2 - CONNEL, B e BAKER, L - Managing as carers of stroke survivors: strategies from the field. Journal of Nursing Practice. Oxford. 10, (2004) p. 121-126.
3 - CRESPO, M ; LÓPEZ, J - Intervencionescon cuidadores de familiares mayores dependientes: una revisión. Psicothema, vol 19 (2007).AN 24805796, disponível: http://web.ebscohost.com/ehost/results
4 - RODRIGUES, P; APARECIDA, R; ANDRADE, O.G - Representaciones del cuidador familiar : Ante el anciano com ACV. Revista de Enfermaria, vol 22 nº6 (1999). ISSN : 0210-5020.
5 - CALDAS, C.P - Contribuindo para a construção da rede de cuidados: trabalhando com a família do idoso portador de sindrome demencial. Revista de Enfermagem. UERJ, Rio de Janeiro, Vol 3, nº 2 (1995) disponível: http://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script.
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7 - PERA, I.P - El cuidador Familiar. Una Revisión sobre la necesidad del cuidado doméstico y sus repercusiones en la familia. Revista de Enfermaria y Humanidades. Ed. Consejo de Enfermeria de la Comunidad Valenciana. (2000).
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8 - MONIS, C; LOPES, G; CARVALHAS, J; MACHADO, S - Sobrecarga do Cuidador Informal. Revista de Formação continuada de Enfermagem - Informar. Ano XI, nº 35, (2005)Dep. legal nº 86 748/95.
9 - COLLIÉRÈ, Marie-Françoise - Promover a vida: da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. 2º edição Lisboa, Edições Técnicas (1999).
10- MARTINS, M.M.F.P.S - Uma crise Acidental na Família. O Doente com AVC. Coimbra, edição Formasau (2002). ISBN 972-8485-30-1.
11- DRISCOLL. A - Managing post-discharge care at home: na analysis of patients’ andtheir carers’ perceptions of information receiced during their stay in hospital. Journal of Advanced Nursing. (2000). Disponível: http://web.ebscohost.com/ehost/detail?vid
12- MARTINS, M.M.S; - A Família, um Suporte ao Cuidar. Revista sinais Vitais. 50, p.52 a 56. Coimbra (2003) ISSN 08728844.